Todos
nós sabemos da grande responsabilidade que se assume no dia em que
participamos de uma sessão espírita pretendendo o posto de interprete
dos Espíritos.
É
natural o desejo de ser médium, de praticar o intercâmbio com o mundo
dos Espíritos, de sustentar conversações com os nossos Guias Espirituais
ou os nossos seres amados que partiram para o Além.
Mas,
o que muitos de nós ignoramos é que os frutos bons que a mediunidade
venha a dar dependem, dentre muitos outros quesitos importantes, do modo
pelo qual ela é desenvolvida.
Em
verdade, a mediunidade não carece de ser provocada. Ela se apresentará
naturalmente, em época oportuna, suave ou violentamente, conforme as
faixas vibratórias que então nos envolvam, trate-se de espíritas ou de
adeptos de outras religiões.
Tratando-se
de pessoa ponderada, estudiosa, fiel à ideia de Deus, dotada de boas
qualidades morais, a mediunidade desponta, frequentemente, com
suavidade, pelos canais da fé e do auxilio ao próximo.
Vemos,
então, profitentes de quaisquer credos religiosos, o espírita
inclusive, impondo as mãos sobre o sofredor e transmitindo o fluido
generoso da cura, do alívio ao angustiado, da esperança ao aflito, sem
que seja necessária a busca sistemática do desenvolvimento, a qual, se
imprudente, na maioria dos casos tende a prejudicar o médium para
sempre.
E
vemos também manifestações fortes, conflitos, enfermidades e até
obsessões, cujo advento se processa, evidentemente, à revelia do
indivíduo que lhes sofre os influxos.
Em
tal acontecendo, é só orientar a mediunidade, instruir o médium, se ele
desconhecer os princípios legados pela Doutrina Espírita; tratá-lo, se
estiver doente, e deixá-lo praticar o bem com o dom recebido da
Natureza.
Todos
esses exemplos, que diariamente se apresentam em nossos caminhos, pois
conhecemos pessoas de outros credos religiosos que também curam com a
imposição das mãos, são lições que devemos acatar.
Indicam
que esses são os médiuns mais seguros porque espontâneos, cuja
faculdade floresceu em tempo preciso, sem necessidade de longos
períodos, incômodos e muitas vezes contraproducentes, das provocações do
desenvolvimento.
Ora,
frequentemente somos solicitados por candidatos ao exercício da
mediunidade para esclarecimento sobre a sua própria situação de
pretendentes ao intercâmbio com o Invisível.
Sentem-se
confusos, inquietos, vacilantes, sem nada obterem de positivo depois de
um, dois e mais anos de esforços para o desenvolvimento, fato por si só
bastante para indicar os pouquíssimos recursos mediúnicos do candidato,
que entretanto é sincero e bem assistido pelo seu Espírito familiar,
não se deixando enlear pela auto-sugestão.
Que
esforços, porém, faz ele? Apenas a presença à mesa de sessões, a
insistência aflitiva para que possa escrever mensagens, coisas belas, ou
fazer oratórias que satisfaçam.
Muitas
vezes, senão de modo geral, o desenvolvimento advém não propriamente da
faculdade mediúnica, mas da própria mente do médium, que assim se
estimula, e então se dá o menos desejado: a subconsciência do médium a
agir por si mesma, excitada pelo esforço e a vontade, como sendo um
agente desencarnado; sua mente a externar-se em comunicações apócrifas,
que só servem para empanar a verdadeira faculdade e empalidecer o brilho
desse dom sublime outorgado por Deus ao homem.
Muitos
dos que insistem no desenvolvimento mediúnico asseveram que determinado
Espírito lhes afiançou que são médiuns dessa ou daquela especialidade;
psicógrafos, de incorporação, de vidência, etc. No entanto, os mestres
da Doutrina Espírita, com Allan Kardec e Leon Denis à frente, e os
Instrutores Espirituais que merecem fé ( porque há os pseudo-mentores
espirituais) desde sempre observaram que "não há nenhum indício pelo
qual se reconheça a existência da faculdade mediúnica. Só a experiência
pode revelá-la". Mesmo que tal faculdade seja de psicografia, de
incorporação ou outra qualquer.
Poderemos,
certamente, experimentar as nossas potencialidades. Mas, a prática tem
demonstrado que a experiência não deverá ultrapassar de alguns poucos
meses, caso nada se obtenha nesse período, justamente para que a
faculdade eventual seja protegida contra a invasão de fenômenos outros,
também psíquicos, mas não mediúnicos; fenômenos que o linguajar moderno
trata de parapsicológicos, e aos quais nós outros até agora temos
denominado de animismo, personismo, auto-sugestão, etc.
O
imoderado desejo de ser médium vai às vezes ao ponto de se exercitar a
vidência. Ora, a vidência é a faculdade melindrosa por excelência, que
não poderá suportar tal tratamento sem sofrer sérios distúrbios. De modo
algum pode ser provocada, a menos que se deseje sugestionar-se de que
está vendo alguma coisa, elaborando então os chamados clichês mentais, a
ideoplastia ( a ideia plasmada na mente pela vontade).É bom não
esquecer que o pensamento é criador, constrói, realiza, mesmo que não
concretize materialmente aquilo que mentaliza ( ver o capítulo VIII de
“O Livro dos Médiuns”.).
A
respeito desses espinhos que às vezes laceram os que tentam a
mediunidade, fez o sábio analista Ernesto Bozzano preciosas observações
em seu elucidador livro "Pensamento e Vontade"; Leon Denis, o
continuador de Allan Kardec, em seu compêndio "No Invisível", brinda-nos
com esclarecimentos substanciosos, enquanto Kardec, além das lições
gerais, diz o seguinte sobre a vidência: "A faculdade de ver os
Espíritos pode, sem dúvida, desenvolver-se, mas é uma das que convém
esperar o desenvolvimento natural, sem o provocar, em não se querendo
ser joguete da própria imaginação. Quando o gérmen de uma faculdade
existe, ela se manifesta de si mesma. Em princípio, devemos
contentar-nos com as que Deus nos outorgou, sem procurarmos o
impossível, por isso que, pretendendo ter muito, corremos o risco de
perder o que possuímos.
Quando
dissemos serem frequentes os casos de aparições espontâneas, não
quisemos dizer que são muito comuns. Quanto aos médiuns videntes,
propriamente ditos, ainda são mais raros e há muito que desconfiar dos
que se inculcam portadores dessa faculdade. É prudente não se lhes dar
crédito, senão diante de provas positivas(...)."
Da
advertência do mestre insigne, deduzimos, portanto, que é absurdo ( a
experiência vem demonstrando que assim é) fazer exercícios visando ao
desenvolvimento da vidência, bem como entregar-se a professores de
vidência.A vidência é manifestação espírita como qualquer outra e,
portanto, os seus registros devem ser examinados por pessoas competentes
e experientes, que os passarão pelo crivo da razão e do bom senso, a
fim de serem aceitos.
Pouco
sabemos ainda sobre a mediunidade. Intensamente, porem, sentimos e
presenciamos os seus efeitos. Achamo-nos ainda nas preliminares da
questão, não obstante datar a mediunidade de todos os tempos, o que
revela ser um dom outorgado por Deus. Mas, o que dela se sabe, apesar da
ignorância em que nos encontramos a seu respeito, já cabe em vários
volumes, como realmente vem cabendo, pois diversos livros existem sobre o
magno assunto.
Uma
das mais importantes faces da mediunidade, e que não podemos ignorar,
porque o Alto disso nos esclarece e a observação confirma, é que a
prática da Caridade e do Amor para com o próximo não somente é
indispensável ao bom desenvolvimento da faculdade, mas também garantia
poderosa ao seu exercício feliz. Não, certamente, a prática de uma
caridade de fachada, interesseira, mas sim inspirada no verdadeiro
sentimento do coração. Desse modo, o candidato a interprete do mundo
espiritual deve iniciar o seu compromisso não só pela frequência às
sessões mediúnicas, mas pela prática do Bem, pelo auxílio ao sofredor,
alem do estudo consciencioso e do empenho em prol da reforma moral
gradativa de si mesmo.
Agindo
assim, no momento em que advenham os sinais indicadores de que
realmente possui faculdades a desenvolver, estas se apresentarão
suavemente, sem choques, por se acharem protegidas pelas faixas
vibratórias da Caridade.
E
será bom repisar: convém não precipitar o desenvolvimento mediúnico. O
seu progresso é lento; a mediunidade, ao que tudo indica, desdobra-se,
indefinidamente, e um médium nunca estará completamente desenvolvido,
mormente nos dias penosos da atualidade, quando mil problemas se
entrechocam ao seu derredor. Quanto mais a cultivarmos, com submissão às
leis divinas, mais ela se ampliará, crescerá no rumo dos conhecimento
espirituais.
Não
existem, pois, médiuns extraordinários, não existem eleitos na
mediunidade. Por conseguinte, não nos devemos fanatizar pela
mediunidade, endeusando os médiuns como se fossem homens e mulheres à
parte na escala humana. Eles são apenas instrumentos, ora bons, ora
maus, das forças invisíveis do Além, consoante o modo pelo qual dirijam
os próprios atos cotidianos. E deixarão de ser médiuns se os Espíritos
não mais puderem ou quiserem se servir deles.
Convém,
pois, que os candidatos ao mediunato meditem bastante ao se aprestarem
para o papel que representarão na seara de Jesus, o Mestre por
excelência. A mediunidade é, certamente, um dom, entre os muitos que
Deus concede às almas criadas à sua imagem e semelhança. E a um dom de
Deus devemos, necessariamente, amar, respeitar e cultivar com sensatez e
prudência.
Revista Reformador, fevereiro de 1971
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