Abra as janelas da alma e espie as belezas da vida, que se desdobram além das tuas agonias, tudo colorindo e felicitando.
Quem se dispõe a encontrar a felicidade, longe das moedas aquisitivas, descobre painéis de indescritível estesia em toda parte.
Levante-se num domingo de sol, antes da
hora habitual, afaste-se do movimento cansativo da rotina doméstica e
busque o campo. Escute no bucolismo da natureza as vozes das coisas,
deixando-se banhar pela clara mensagem de luz da manhã em festa. Apague
as impressões do pessimismo e pare ao lado dos pequenos regatos cantando
variadas estórias com as águas em desalinho sinuoso e incessante
correria. Descobrirá, em cada filete d’água espremido na rocha ou em
cada córrego buscando largura no solo para espalhar-se, uma musicalidade
especial. Se você tiver ouvidos, indentificará que murmuram queixas,
competem com o vento, gargalham com a luz, cantam, simplesmente cantam.
Alongue os olhos, andando vagarosamente
pelos caminhos: verde avenca segura-se com firmeza no montículo de
terra; torturada trepadeira abre-se em flor no tronco escuro de vetusto
arvoredo, cobrindo o ar com perfumada renda que contrasta em sua
delicadeza com o tronco imponente; débil colibri, colorido e vivaz,
singra os rios do firmamento e, longe, sanhaços verde-azuis em algaravia
canora parecem palrar em revoada alegre...
Aspire esse ar puro do dia nascente e
debruce-se sobre o peitoril da janela do otimismo ante a paisagem
ridente, esquecendo por momentos as rotineiras preocupações.
Empolgar-se-á com a mensagem do dia, abençoando a vida e compondo
sinfonias divinas em toda parte.
Um ramo de quaresmeira aberto em flor,
oscilando ao vento, salmodiando cores no veludo do capinzal e
multicoloridas coreópsis, farfalhando levemente, falar-lhe-ão sem
palavras sobre a felicidade real, ensejando dilatação das suas ambições,
além das coisas esmagadoras do currículo normal.
Há poesia no pôr do sol, esperando os seus olhos; cascatas de luz em poeira de ouro fino carregado pelos favônios perfumados compondo espetáculos de cor; melodias espalhadas nos braços da árvore vibrando, vibrando no ar...
Há poesia no pôr do sol, esperando os seus olhos; cascatas de luz em poeira de ouro fino carregado pelos favônios perfumados compondo espetáculos de cor; melodias espalhadas nos braços da árvore vibrando, vibrando no ar...
Tudo são belezas na Criação. Por que você se engolfa na tristeza injustificável?
Saia do cárcere estreito das sôfregas
ambições materiais e embriague sua alma de festa natural no banquete de
um dia de sol ou no repouso de uma noite enluarada, cujo manto de
princesa salpicado de gemas faiscantes em rendas finas de prata
murmurante convida à meditação... E você compreenderá que o seu coração é
triste porque se amesquinhou na concha escura de si mesmo, fechando a
janela por onde poderia enxergar o mundo de Nosso Pai, onde Jesus cantou
o amor na sua mais alta expressão.
Algures, num aclive salpicado de gramínea baixa, compôs Ele as inexcedíveis bem-aventuranças.
Em praias brancas, pontilhadas de seixos e pedregulhos, socorreu órfãos e velhinhos.
Deambulando por caminhos recobertos de
largas sombras de velhas figueiras e tamarindeiros, falou a esfaimados
da esperança e justiça.
Em claras manhãs de luz pregou e viveu o poema sem palavras da Boa Nova.
E tendo elegido para berço u’a
manjedoura modesta, recebeu um madeiro de odiosa punição indébita para
morrer, numa tarde de calor, sobre um monte sem relva, abraçando, em
contato com o poente ensanguentado de sol, ensanguentado também Ele, a
Humanidade inteira...
Embora as necessidades para a manutenção
do corpo na reencarnação que lhe enseja ressarcimento de dívidas,
considere como felicidade esses dons sem preço que vestem a Terra e,
renovado, após um giro longe das cogitações materiais imediatas, você
retornará ao ninho doméstico de coração cantando festivas melodias de
paz sob o aplauso de uma consciência referta de júbilo, descobrindo
porque Jesus, diante de tantas coisas da vida, na Terra, referiu-se ao
Reino de Deus como sinfonia sublime emboscado “dentro de nós” e que
poderíamos dilatar por toda parte com festa na alma.
Amélia Rodrigues
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