Dor Evolução
Desde as mais remotas épocas, o homem foi sempre vitimado pela dor e,
incansavelmente, buscou entender as suas causas. Adotou práticas
místicas e cabalísticas, elaborou teorias de formas de vida e de crença
no intuito de se livrar ou minimizar as consequências da dor. Seitas,
religiões e filosofias vêm buscando na vida material, e fora dela,
explicações para as catástrofes, flagelos, doenças, aleijões humanos e
outras perturbações que promovem a aflição. Expiação dos pecados;
provação para o exercício da fé; consequências dos desvarios da
humanidade na busca do prazer vulgar e imediato, e aguilhão necessário
ao progresso tecnológico e moral do homem têm sido explicações adotadas
para justificar a razão do sofrimento.
O entendimento da natureza e do papel que a dor ocupa na história da humanidade passam pela abordagem dos traços culturais e antropológicos dos homens atingidos por esse fenômeno tão complexo, não aceito com naturalidade pela maioria de todos nós. Daí a diversidade de interpretação sobre ela.
O entendimento da natureza e do papel que a dor ocupa na história da humanidade passam pela abordagem dos traços culturais e antropológicos dos homens atingidos por esse fenômeno tão complexo, não aceito com naturalidade pela maioria de todos nós. Daí a diversidade de interpretação sobre ela.
Antiguidade
Os sábios da Antiguidade grega teorizaram sobre a natureza da dor e
formas de evitá-la ou minimizar a sua ação. Platão (427-347 a.C.)
afirmou que “A dor ocorre quando a proporção ou a harmonia dos elementos
que compõem o ser vivo é ameaçada ou comprometida”. Assim, segundo o
discípulo de Sócrates, vivendo em harmonia consigo mesmo e com a
Natureza, o homem se livra da dor. Epicuro (341-270 a.C.) admitia que a
dor era uma consequência da busca do prazer vulgar e desmesurado. Zenon
de Cicio (334-262 a.C.), fundador do estoicismo, ensinava que as paixões
são as causas do sofrimento e que, para evitá-lo, deveria o homem
seguir a natureza, aceitando o destino e conservando a serenidade em
qualquer circunstância.
O judaísmo, por sua vez, entendia a dor como um castigo divino pela desobediência, resquício de um impiedoso atavismo do “pecado original”. Quando Adão e Eva foram expulsos do Paraíso, Jeová castigou a mulher a dar à luz com dor e ao homem a ganhar o pão com o suor de seu rosto. A história de Jó, no Antigo Testamento, é forte testemunho desse complexo de culpa. Jesus desenvolveu esforços para desfazer essa concepção de dor-castigo, quando bem-aventurou os aflitos, assinalando que o sofrimento seria oportunidade de purificação da alma.
O judaísmo, por sua vez, entendia a dor como um castigo divino pela desobediência, resquício de um impiedoso atavismo do “pecado original”. Quando Adão e Eva foram expulsos do Paraíso, Jeová castigou a mulher a dar à luz com dor e ao homem a ganhar o pão com o suor de seu rosto. A história de Jó, no Antigo Testamento, é forte testemunho desse complexo de culpa. Jesus desenvolveu esforços para desfazer essa concepção de dor-castigo, quando bem-aventurou os aflitos, assinalando que o sofrimento seria oportunidade de purificação da alma.
Idade Média e Mediunidade
Durante a Idade Média, os homens, interpretando mal a dinâmica da vida, aplicavam a dor como instrumento de justiça e de repressão, submetendo os condenados a sessões de torturas públicas, acreditando que assim educaria o povo a obedecer às ordens emanadas do Estado e da Igreja. Fortalecida pela Igreja, a cultura judaico-cristã insistia que a doença era um castigo divino ou forma de advertência ao povo pecador. Doenças incuráveis à época, tal como a lepra, e as epidemias que assolavam milhares de vidas, enquadravam-se na visão de um deus antropomórfico caprichoso e vingativo que refletia as características morais do homem medieval, que não via as causas daqueles flagelos na falta de saneamento básico, na alimentação inadequada e no descuido com a higiene pessoal.
No início do século XVIII houve um salto e o filósofo inglês Alexander Pope (1688-1744) ensinava que se deveria considerar a dor individual como um sofrimento parcial a serviço de um bem universal, alertando, sem dúvida, para os cuidados que se deveriam ter no alastramento das infecções. O Arquidiácono William Paley (1743-1805) pensava da mesma forma: administrava aos estudantes de Cambridge que a dor de um era um mal menor, destinado a proteger a humanidade de um mal muito maior. Exemplificava que uma doença nos dedos dos pés era uma advertência providencial para reduzir o consumo de álcool, que posteriormente poderia provocar uma crise de gota. Aqui, nos parece uma referência à dor-auxílio, de que André Luiz vem conceituar muito bem.
Durante a Idade Média, os homens, interpretando mal a dinâmica da vida, aplicavam a dor como instrumento de justiça e de repressão, submetendo os condenados a sessões de torturas públicas, acreditando que assim educaria o povo a obedecer às ordens emanadas do Estado e da Igreja. Fortalecida pela Igreja, a cultura judaico-cristã insistia que a doença era um castigo divino ou forma de advertência ao povo pecador. Doenças incuráveis à época, tal como a lepra, e as epidemias que assolavam milhares de vidas, enquadravam-se na visão de um deus antropomórfico caprichoso e vingativo que refletia as características morais do homem medieval, que não via as causas daqueles flagelos na falta de saneamento básico, na alimentação inadequada e no descuido com a higiene pessoal.
No início do século XVIII houve um salto e o filósofo inglês Alexander Pope (1688-1744) ensinava que se deveria considerar a dor individual como um sofrimento parcial a serviço de um bem universal, alertando, sem dúvida, para os cuidados que se deveriam ter no alastramento das infecções. O Arquidiácono William Paley (1743-1805) pensava da mesma forma: administrava aos estudantes de Cambridge que a dor de um era um mal menor, destinado a proteger a humanidade de um mal muito maior. Exemplificava que uma doença nos dedos dos pés era uma advertência providencial para reduzir o consumo de álcool, que posteriormente poderia provocar uma crise de gota. Aqui, nos parece uma referência à dor-auxílio, de que André Luiz vem conceituar muito bem.
A Dor e o Espiritismo
Como a dor, algo tão negativo, do ponto de vista humano, pode ser um
benefício para a criatura que Deus criou pare ser feliz? E aqui grifo o
termo criatura, porque não é somente o ser racional que experimenta o
sofrimento, mas também os irracionais.
A Doutrina Espírita veio trazer a resposta a essa interrogação. A pluralidade das existências é a solução racional que se coaduna com a Justiça e Bondade divinas, para justificar a existência da dor, cujas causas podem ser encontradas na atual existência ou em outras. A dor não é castigo, não é capricho e nem ira do Criador com a sua criatura. “Por mais admirável que possa parecer à primeira vista, a dor é apenas um meio de que usa o Poder Infinito para nos chamar a si e, ao mesmo tempo, tornar-nos mais rapidamente acessíveis à felicidade espiritual, única duradoura”.
Mais recentemente, o Espírito André Luiz nos trouxe valiosas contribuições que aprofundam-nos compreensão exata do sofrimento humano, quando nos ensina que a dor tem naturezas e papéis diferenciados no processo de nosso progresso moral e espiritual, existindo, portanto, dor-expiação, dor-auxílio e dor-evolução. Explica ele que “[...] a dor-expiação, que vem de dentro para fora, marcando a criatura no caminho dos séculos, detendo-a em complicados labirintos de aflição, para regenerá-la, perante a Justiça [...].” Quanto à dor-auxílio adianta que “[...] pela intercessão de amigos devotados à nossa felicidade e à nossa vitória, recebemos a bênção de prolongadas e dolorosas enfermidades no envoltório físico, seja para evitar-nos a queda no abismo da criminalidade, seja, mais frequentemente, para o serviço preparatório da desencarnação, a fim de que não sejamos colhidos por surpresas arrasadoras, na transição da morte. O enfarte, a trombose, a hemiplegia, o câncer penosamente suportado, a senilidade prematura e outras calamidades da vida orgânica constituem, por vezes, dores-auxílio, para que a alma se recupere de certos enganos em que haja incorrido na existência do corpo denso, habilitando-se, através de longas reflexões e benéficas disciplinas, para o ingresso respeitável na Vida Espiritual.” Parece-nos que William Paley já fazia referência a essa modalidade de dor...
A Doutrina Espírita veio trazer a resposta a essa interrogação. A pluralidade das existências é a solução racional que se coaduna com a Justiça e Bondade divinas, para justificar a existência da dor, cujas causas podem ser encontradas na atual existência ou em outras. A dor não é castigo, não é capricho e nem ira do Criador com a sua criatura. “Por mais admirável que possa parecer à primeira vista, a dor é apenas um meio de que usa o Poder Infinito para nos chamar a si e, ao mesmo tempo, tornar-nos mais rapidamente acessíveis à felicidade espiritual, única duradoura”.
Mais recentemente, o Espírito André Luiz nos trouxe valiosas contribuições que aprofundam-nos compreensão exata do sofrimento humano, quando nos ensina que a dor tem naturezas e papéis diferenciados no processo de nosso progresso moral e espiritual, existindo, portanto, dor-expiação, dor-auxílio e dor-evolução. Explica ele que “[...] a dor-expiação, que vem de dentro para fora, marcando a criatura no caminho dos séculos, detendo-a em complicados labirintos de aflição, para regenerá-la, perante a Justiça [...].” Quanto à dor-auxílio adianta que “[...] pela intercessão de amigos devotados à nossa felicidade e à nossa vitória, recebemos a bênção de prolongadas e dolorosas enfermidades no envoltório físico, seja para evitar-nos a queda no abismo da criminalidade, seja, mais frequentemente, para o serviço preparatório da desencarnação, a fim de que não sejamos colhidos por surpresas arrasadoras, na transição da morte. O enfarte, a trombose, a hemiplegia, o câncer penosamente suportado, a senilidade prematura e outras calamidades da vida orgânica constituem, por vezes, dores-auxílio, para que a alma se recupere de certos enganos em que haja incorrido na existência do corpo denso, habilitando-se, através de longas reflexões e benéficas disciplinas, para o ingresso respeitável na Vida Espiritual.” Parece-nos que William Paley já fazia referência a essa modalidade de dor...
A Dor-Evolução
Há quem pense, mesmo entre espíritas, que o sofrimento é sempre uma
punição, que a criatura está enfrentando adversidades por que merece...
Mas nem sempre é assim. Será imprudência generalizar a natureza da dor
de cada um. “A dor é ingrediente dos mais importantes na economia da
vida em expansão. O ferro sob o malho, a semente na cova, o animal em
sacrifício, tanto quanto a criança chorando, irresponsável ou
semiconsciente, para desenvolver os próprios órgãos, sofrem a
dor-evolução, que atua de fora para dentro, aprimorando o ser, sem a
qual não existiria progresso”.
Na cura do cego de Siloé (Jo 9:1-41), Jesus responde aos que lhe desafiavam a sabedoria e o poder, que nem o cego nem os seus pais haviam pecado para que se justificasse sua condição de cego de nascença, mas que ali estava para que nele se manifestassem as obras de Deus, permitindo inferir que haja quem sofra sem está em débito com a contabilidade divina. Interrogado a respeito dessa passagem evangélica, o Espírito Vianna de Carvalho confessa acreditar realmente no que ficou registrado pelo apóstolo de Patmos. Na mesma linha de raciocínio, o Codificador, com sua peculiar lucidez e bom-senso, admite, no caso, que “se não era uma expiação do passado, era uma provação apropriada ao progresso daquele Espírito, porquanto Deus, que é justo, não lhe imporia um sofrimento sem utilidade”. (Grifamos)
Embora tenhamos a certeza que muitos Espíritos sem carma reencarnam na Terra por amor a alguém ou por algum ideal e submetendo-se às leis da matéria sofram sem merecerem, raros são os registros que nos permitem afirmar com convicção esse ou aquele caso. Mas o Espírito Emmanuel nos revela dois desses casos. Quem ler os livros Ave Cristo e Renúncia pulando o 1º capítulo de cada um deles, vai admitir que as dores por que passaram Quinto Varro e Alcíone foram expiações por faltas do passado. Mas não foi bem isso.
Na cura do cego de Siloé (Jo 9:1-41), Jesus responde aos que lhe desafiavam a sabedoria e o poder, que nem o cego nem os seus pais haviam pecado para que se justificasse sua condição de cego de nascença, mas que ali estava para que nele se manifestassem as obras de Deus, permitindo inferir que haja quem sofra sem está em débito com a contabilidade divina. Interrogado a respeito dessa passagem evangélica, o Espírito Vianna de Carvalho confessa acreditar realmente no que ficou registrado pelo apóstolo de Patmos. Na mesma linha de raciocínio, o Codificador, com sua peculiar lucidez e bom-senso, admite, no caso, que “se não era uma expiação do passado, era uma provação apropriada ao progresso daquele Espírito, porquanto Deus, que é justo, não lhe imporia um sofrimento sem utilidade”. (Grifamos)
Embora tenhamos a certeza que muitos Espíritos sem carma reencarnam na Terra por amor a alguém ou por algum ideal e submetendo-se às leis da matéria sofram sem merecerem, raros são os registros que nos permitem afirmar com convicção esse ou aquele caso. Mas o Espírito Emmanuel nos revela dois desses casos. Quem ler os livros Ave Cristo e Renúncia pulando o 1º capítulo de cada um deles, vai admitir que as dores por que passaram Quinto Varro e Alcíone foram expiações por faltas do passado. Mas não foi bem isso.
No Ave Cristo, Quinto Varro solicita a Clódio – entidade de esfera
superior – seu regresso à Terra para auxiliar Taciano, que fora seu
filho na última existência e que não conseguira conduzi-lo ao Cristo
como pretendera, e a resposta foi:
“- Mas, por quê? Conheço-te o acervo de serviços, não somente à causa da ordem, mas igualmente à causa do amor. No mundo patrício, as tuas derradeiras romagens foram as do homem correto até ao extremo sacrifício e os teus primeiros ensaios na edificação cristã foram dos mais dignos. Não será aconselhável o prosseguimento de tua marcha, acima das inquietantes paisagens da carne” . (Grifamos)
No Renúncia, Alcíone, Espírito de elevada hierarquia, prestando serviços no sistema de Sírius, dirige-se a Antênio, seu mentor, que cumpria as ordenações de Jesus, solicitando sua volta à Terra, para cooperar com Pólux, seu eterno amor. Depois de muito argumentar, não concordando com seu retorno, já que não acreditava que Pólux estivesse pronto para merecer seu sacrifício, diz-lhe:
“- Recorda que as leis planetárias não afetam somente os espíritos em aprendizado ou reparação, mas, também, os missionários da mais elevada estirpe. Experimentarás, igualmente, o olvido das tuas conquistas, sentirás o mesmo desejo de compreensão e a mesma sede de afeto que palpitam nos outros mortais.” (Grifamos.)
Diante dessas revelações, podemos concluir que a dor não é somente produto da consciência culpada. “Não há crer, no entanto, que todo sofrimento suportado neste mundo denote a existência de uma determinada falta. Muitas vezes são simples provas buscadas pelo Espírito para concluir a sua depuração e ativar o seu progresso. Assim, a expiação serve sempre de prova, mas nem sempre a prova é uma expiação.” Nos casos de Quinto Varro e Alcíone, foram eles provados na sua grandeza moral, alcançando patamares mais elevados do progresso espiritual pelos seus sacrifícios em nome do amor.
“Pela dor – afirma Denis -, descobre-se com mais segurança o lugar onde brilha o mais belo, o mais doce raio da verdade, aquele que não se apaga”. E, nessa linha, lapidou o poeta Francisco Otaviano de Almeida Rosa (1825 - 1889): “Quem passou pela vida em branca nuvem,/E em plácido repouso adormeceu;/Quem não sentiu o frio da desgraça,/Quem passou pela vida e não sofreu;/Foi espectro de homem, não foi homem,/Só passou pela vida, não viveu.”
“- Mas, por quê? Conheço-te o acervo de serviços, não somente à causa da ordem, mas igualmente à causa do amor. No mundo patrício, as tuas derradeiras romagens foram as do homem correto até ao extremo sacrifício e os teus primeiros ensaios na edificação cristã foram dos mais dignos. Não será aconselhável o prosseguimento de tua marcha, acima das inquietantes paisagens da carne” . (Grifamos)
No Renúncia, Alcíone, Espírito de elevada hierarquia, prestando serviços no sistema de Sírius, dirige-se a Antênio, seu mentor, que cumpria as ordenações de Jesus, solicitando sua volta à Terra, para cooperar com Pólux, seu eterno amor. Depois de muito argumentar, não concordando com seu retorno, já que não acreditava que Pólux estivesse pronto para merecer seu sacrifício, diz-lhe:
“- Recorda que as leis planetárias não afetam somente os espíritos em aprendizado ou reparação, mas, também, os missionários da mais elevada estirpe. Experimentarás, igualmente, o olvido das tuas conquistas, sentirás o mesmo desejo de compreensão e a mesma sede de afeto que palpitam nos outros mortais.” (Grifamos.)
Diante dessas revelações, podemos concluir que a dor não é somente produto da consciência culpada. “Não há crer, no entanto, que todo sofrimento suportado neste mundo denote a existência de uma determinada falta. Muitas vezes são simples provas buscadas pelo Espírito para concluir a sua depuração e ativar o seu progresso. Assim, a expiação serve sempre de prova, mas nem sempre a prova é uma expiação.” Nos casos de Quinto Varro e Alcíone, foram eles provados na sua grandeza moral, alcançando patamares mais elevados do progresso espiritual pelos seus sacrifícios em nome do amor.
“Pela dor – afirma Denis -, descobre-se com mais segurança o lugar onde brilha o mais belo, o mais doce raio da verdade, aquele que não se apaga”. E, nessa linha, lapidou o poeta Francisco Otaviano de Almeida Rosa (1825 - 1889): “Quem passou pela vida em branca nuvem,/E em plácido repouso adormeceu;/Quem não sentiu o frio da desgraça,/Quem passou pela vida e não sofreu;/Foi espectro de homem, não foi homem,/Só passou pela vida, não viveu.”
Waldehir Bezerra de Almeida
Artigo retirado do site de "O Clarim"
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Fonte: Forum Entendimento Espírita
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