Eternidade

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sábado, 31 de maio de 2014

A necessidade da encarnação


ESE, Capítulo IV, 25 e 26

 24 de maio de 2005

Introdução

No item 25 do Capítulo IV de O Evangelho Segundo o Espiritismo, Kardec pergunta aos Espíritos sobre a necessidade da encarnação e, no item 26, comenta sobre a resposta que eles dão. É o assunto tratado nestes itens que iremos hoje estudar.

No trecho em questão, veremos que Kardec perguntou sobre a encarnação e os Espíritos responderam como se ele tivesse perguntado sobre a reencarnação, uma vez que se prenderam à intenção e não à letra da pergunta. Para o nosso objetivo, no entanto, acreditamos ser necessário fazer clara a distinção entre o que seja a necessidade da encarnação e a da reencarnação, posto que ambas são necessárias e por diferentes razões.
Encarnar é viver em um corpo físico, não implicando em nenhuma conotação adicional com respeito à quantidade de vezes em que isso é possível a um único Espírito. Quando queremos saber porque necessitamos encarnar, nossa dúvida é quanto ao ser ou não ser possível evoluir o tempo todo na espiritualidade, sem jamais interagir com a matéria bruta. Já, quando falamos em reencarnar, estamos falando sobre a necessidade do Espírito encarnar ou não mais de uma vez. Tal questão está relacionada ao percurso necessário para que possamos evoluir e a verificarmos se uma única vida é tempo bastante para tal intento. Sabendo, agora, do que vamos tratar, vamos, inicialmente, falar da necessidade da encarnação para, somente depois, tratarmos da necessidade da reencarnação.

A Necessidade da Encarnação

Não poucas vezes algum irmão nos pergunta sobre o porque de precisarmos encarnar, uma vez que, segundo afirma, com base no relato dos autores espirituais, tudo o que se encontra na Terra também se encontra no plano espiritual. Lembram os irmãos que assim pensam que, no plano espiritual, existem lares, famílias, cidades e comunidades várias, amigos e inimigos, trabalho e repouso, veículos, tudo, enfim, de que alguém necessita para ter uma vida igual àquela que se passa na Terra, sendo possível lá, como cá, praticar a reforma íntima e evoluir pelo estudo sério e pelo trabalho caritativo dedicado e amoroso.
A resposta a tal questionamento é justamente o tema da primeira parte deste estudo, isto é, saber qual a real necessidade da encarnação, qual a real necessidade de vivermos em um corpo material e de interagirmos com a matéria bruta para podermos evoluir até a perfeição.
Se lermos com atenção a resposta que São Luiz deu a Kardec no Item 25 de O Evangelho Segundo o Espiritismo, vermos que ela não satisfaz a curiosidade de tais irmãos. 

25. É um castigo a encarnação e somente os Espíritos culpados estão sujeitos a sofrê-la?
A passagem dos Espíritos pela vida corporal é necessária para que eles possam cumprir, por meio de uma ação material, os desígnios cuja execução Deus lhes confia. É-lhes necessária, a bem deles, visto que a atividade que são obrigados a exercer lhes auxilia o desenvolvimento da inteligência. Sendo soberanamente justo, Deus tem de distribuir tudo igualmente por todos os seus filhos; assim é que estabeleceu para todos o mesmo ponto de partida, a mesma aptidão, as mesmas obrigações a cumprir e a mesma liberdade de proceder. Qualquer privilégio seria uma preferência, uma injustiça. Mas, a encarnação para todos os Espíritos, é apenas um estado transitório. É uma tarefa que Deus lhes impõe, quando iniciam a vida, como primeira experiência do uso que farão do livre arbítrio. Os que desempenham com zelo essa tarefa transpõem rapidamente e menos penosamente os primeiros graus da iniciação e mais cedo gozam do fruto de seus labores. Os que, ao contrário, usam mal da liberdade que Deus lhes concede retardam a sua marcha e, tal seja a obstinação que demonstrem, podem prolongar indefinidamente a necessidade da reencarnação e é quando se torna um castigo. - S. Luís. (Paris, 1859.)

Ora, por que – perguntariam eles, provavelmente insatisfeitos com a resposta de São Luís – os desígnios de Deus hão de requerer ação no plano material? Se, tanto a inteligência quanto a bondade, podem ser desenvolvidos na espiritualidade, qual a necessidade de se encarnar, qual a necessidade de se agir no plano material? Na espiritualidade – continuariam eles - não estaríamos, também, exercendo, a todo instante, o livre-arbítrio e nos sujeitando todo tempo à lei da causalidade e às demais leis de Deus? Não nos é possível, lá, tanto quanto cá – concluiriam - fazermos uso de nosso livre-arbítrio e de nossa força de vontade tanto para o bem quanto para o mal?
Tentando encaminhar essa questão, vejamos o que Kardec perguntou aos Espíritos, no desdobramento “a” da Questão 175 de O Livro dos Espíritos:

175. Haverá alguma vantagem em voltar-se a habitar a Terra?
 “Nenhuma vantagem particular, a menos que seja em missão, caso em que se progride aí como em qualquer planeta.”
a)     Não se seria mais feliz permanecendo na condição de Espírito?
“Não, não; estacionar-se-ia e o que se quer é caminhar para Deus.”

Está aí uma afirmação que nos interessa. Que estarão querendo dizer os Espíritos, ao afirmarem, de modo tão peremptório, que permanecer na espiritualidade é o mesmo que estacionar? O raciocínio de nossos irmãos nos estava conduzindo à conclusão contrária, não é mesmo?
Mais adiante, ainda em O Livro dos Espíritos, Kardec continua:

196. Não podendo os Espíritos aperfeiçoar-se, a não ser por meio das tribulações da existência corpórea, segue-se que a vida material seja uma espécie de crisol ou de depurador, por onde têm que passar todos os seres do mundo espírita para alcançarem a perfeição?
 “Sim, é exatamente isso. Eles se melhoram nessas provas, evitando o mal e praticando o bem; porém, somente ao cabo de mais ou menos longo tempo, conforme os esforços que empreguem; somente após muitas encarnações ou depurações sucessivas, atingem a finalidade para que tendem.”

Está mais que claro, pela Codificação, tanto em O Evangelho Segundo o Espiritismo quanto em O Livro dos Espíritos, que os Espíritos só podem evoluir encarnados. Foi o que disseram os Espíritos e o que Kardec entendeu e aceitou. Mas, por que?
A vasta obra de André Luiz, que nos veio pela abençoada mediunidade de nosso saudoso Chico, trouxe-nos preciosos ensinamentos de como as coisas se passam no mundo espiritual, ensinamentos esses, mais tarde, corroborados por diversos outros Espíritos, através de outros médiuns. Vejamos se desse farto material, aliado às lições que obtemos da Codificação, tiramos algum elemento que falta ao nosso raciocínio.
O estudioso atento e que aprendeu que a Doutrina é evolutiva, aprende, por exemplo, que nossa real identidade no mundo espiritual é transparente, podendo nossos inimigos de outras eras reconhecer-nos sem grande dificuldade, ao contrário do que ocorre quando estamos encarnados, onde uma nova personalidade nos esconde dos desafetos que nos queiram prejudicar. Fica sabendo, também, que não há dissimulação no plano espiritual, sendo nossos pensamentos e emoções facilmente percebíveis por quem esteja em nossa faixa de sintonia.
Qualquer tentativa de nos reconciliarmos com alguém a quem tenhamos prejudicado no passado incorrerá em fracasso se estivermos no plano espiritual, uma vez que nosso medo da reação de nossos desafetos ou nossa postura defensiva contra sua possível vingança estarão sempre a nos denunciar. Do mesmo modo que o cão percebe se a pessoa perto dele está serena ou com medo, amorosa ou agressiva, reagindo conforme tal percepção, os Espíritos desencarnados percebem as emoções e pensamentos uns dos outros e reagem de acordo com eles, de nada valendo o autocontrole com que qualquer um deles tente esconder o que sente ou o que pensa dos demais.
Impossibilitados de nos reconciliar com nossos desafetos do passado e fazendo novos desafetos a todo instante pela impossibilidade de escondermos dos outros nossos pensamentos e emoções a respeito deles, já não nos parece mais difícil entender porque ficaríamos praticamente estacionados se permanecêssemos indefinidamente no plano espiritual. Podermos evoluir envolvidos em atividades caridosas com o apoio de Espíritos mais evoluídos, sem dúvida. No entanto, somente conseguiríamos ajudar os Espíritos sofredores caso esses não nos conhecessem ou caso, apesar de nos conhecerem, nada de mal tivesse jamais ocorrido entre eles e nós. 
Por outro lado, ao encarnarmos, nos é dada uma oportunidade toda nova de recomeço. Temos uma nova aparência, nada lembramos de nossas vivências pretéritas e possuímos domínio sobre o que falamos e sobre a expressão que estampamos em nosso rosto, sendo-nos possível dissimular pensamentos e emoções. Nossos Espíritos Protetores utilizam tal situação para juntar, nas mesmas famílias, nas mesmas comunidades, Espíritos que necessitam de reconciliação. Protegidos uns dos outros pelo “disfarce” do corpo físico, temos a oportunidade de travar novas relações com todos. Se soubermos fazer uso dessa possibilidade, com sabedoria, não só não mais faremos desafetos como iremos, pouco a pouco, reparando nossos erros do passado e sublimando, em relações de família equilibradas e amorosas, o ódio dos inimigos figadais de outrora.
A encarnação é, portanto, mais uma benção que recebemos da bondade divina. Toda vida existente no universo deve ser respeitada como tal. Porém, sabermos amar a vida onde quer que ela se encontre pressupõe que saibamos amar a nossa própria.
Aprendamos, portanto, a amar e respeitar nosso corpo, tratando-o com cuidado e atenção, para que, saudável, ele seja o instrumento de nosso progresso e dos demais seres com quem nos relacionamos na vida. Afinal, o corpo físico que ganhamos a cada encarnação é o templo onde, com estudo e trabalho no bem, construiremos o reino dos céus que Jesus ensinou estar dentro de nós.

A Necessidade da Reencarnação

Agora que já sabemos que é necessário encarnar, viver em um corpo físico, para evoluir, resta estudarmos o porque de necessitarmos viver em um corpo físico mais de uma vez. A pergunta que ora se coloca, portanto, é: Qual a Necessidade da Reencarnação?
Uma vez que acreditamos serem as leis de Deus soberanamente justas, somos forçados a admitir que fomos todos, sem exceção, criados no mesmo estágio inicial, isto é, simples e ignorantes, e dotados do mesmo potencial evolutivo, que nos levará à perfeição.
Imaginar que um de nós possa ter sido criado sábio, belo e saudável e um outro, deficiente mental, feio e doente, que um possa ter sido criado caridoso e gentil e outro, perverso e violento, admitir tais possibilidades é negar justiça nas leis divinas, o que equivale a negar a própria divindade.
Dizemos isso com segurança, pois não pode Deus ser menos justo que o homem. Se, mesmo a humanidade, ainda tão atrasada, sabe ser justa nas competições esportivas, separando cada desporto em classes e categorias, de acordo com as habilidades atingidas pelos participantes, como poderíamos esperar de Deus menor justiça, privilegiando a uns e prejudicando a outros em uma disputa desigual?
Desse modo, não há como negar que somos todos criados iguais e temos todos o mesmo destino. Resta uma questão: será possível a um de nós evoluir do estado de simplicidade e ignorância completas ao de perfeição moral e intelectual em uma só existência?
As evidencias obtidas até hoje pelos paleontólogos nos revelam que a espécie humana surgiu, há, aproximadamente, dois milhões e meio de anos, provavelmente na África. Mesmo se admitirmos, o que não corresponde à realidade, que iniciamos nossa jornada no reino hominal, o bom-senso e um simples raciocínio nos levam a concluir pela total impossibilidade de um ser humano, no estágio desse homem primitivo, que sequer o fogo sabia fazer, poder passar ao de um moderno gênio da ciência, capaz de desvendar os segredos do átomo, em uma única existência, fosse ela de 50, 70, 100 ou mesmo 1000 anos.
Supor que aquele Homo Habilis viveu uma única vida é negar a premissa de que todo ser humano é fadado à perfeição. Nem necessitamos ir tão longe no passado. Olhemos para nós mesmos: quanto tempo nos falta para chegarmos ao estágio de um Ghandi, de um Chico Xavier ou de uma Madre Tereza? Com sinceridade, pode algum de nós ser tão ingênuo para achar que consegue chegar lá ainda nesta vida? Não, para evoluirmos, mesmo do estágio em que estamos neste século XXI até à perfeição faltam milênios e esses milênios requerem a pluralidade de existências.
O que está na origem de nossa necessidade de reencarnar, portanto, é a Lei da Evolução. Somos todos criados simples e ignorantes e temos todos o mesmo potencial de evolução, tanto em bondade quanto em sabedoria. E, ao fim da jornada seremos todos perfeitos. Não dizemos isso por pura especulação, nem, tampouco, baseados na Codificação. Quem nos disse que, um dia, seremos perfeitos foi Jesus, ao nos exortar:
“Portanto, sejam perfeitos como é perfeito o Pai de vocês que está no céu". (Mt 5,48)

Perfeição, a Nossa Meta Final

Tem-se escutado, quando em vez, expositores falando em uma tal “perfeição relativa”. Isso nos preocupa porque pode levar alguém a conclusões erradas. Desse modo, vamos refletir um pouco sobre o relativo e o absoluto.
 O mecânico de automóveis que não erra nenhum diagnóstico e que repara peças e sistemas defeituosos de modo a que o veículo volte a funcionar como se novo fosse, pode ser chamado de um mecânico perfeito. O engenheiro civil que não erra nenhum cálculo, não esquece nenhuma especificação e tudo faz em conformidade com os melhores critérios de projeto, pode ser entendido como um engenheiro civil perfeito. O aluno que domina todas as matérias do Ensino Fundamental e ao qual se pode fazer qualquer pergunta desse ciclo acadêmico sem que ele erre a resposta, pode ser chamado de aluno perfeito do Ensino Fundamental. No entanto, se pedirmos ao mecânico de automóveis perfeito que ele conserte um avião, ao engenheiro civil perfeito que ele projete um circuito eletrônico ou ao aluno perfeito do Ensino Fundamental que nos responda uma questão do Ensino Médio, todos eles fracassarão na resposta à nossa solicitação. Fica claro, portanto, que cada um deles é perfeito em relação ao conhecimento que estudou. Isso é o que se chama de “perfeição relativa”.
Um Espírito que tenha aprendido tudo o que pode ser aprendido junto à humanidade terrestre, pode ser dito perfeito relativamente à humanidade terrestre. Se ele tiver aprendido tudo o que é possível aprender nos diversos mundos do nosso sistema solar, ele poderá ser dito perfeito relativamente ao sistema solar. É assim que iremos evoluir, superando cada o estágio associado a cada mundo quando pensarmos e agirmos com a perfeição relativa a cada um.
Não podemos perder de vista, no entanto, por mais que saibamos que, a cada estágio que superarmos, nos faremos perfeitos em relação a ele, que a nossa meta final é a perfeição absoluta. Atingiremos a perfeição absoluta quando nada mais houver na criação que não saibamos, quando tudo o que pensarmos ou fizermos em qualquer parte de qualquer universo esteja em exata concordância com as leis de Deus. Nesse estágio final, o relativo deixa de existir, posto que algo que seja relativo a tudo é absoluto para tudo.
Essa perfeição absoluta à qual um dia chegaremos é a perfeição possível a uma criatura. Como Jesus nos ensinou a ver Deus como Pai, de natureza, portanto, semelhante à nossa, fica claro o que o Mestre quis dizer quando nos exortou: “...sejam perfeitos como é perfeito o Pai de vocês que está no céu.”
Entendendo Deus como a Inteligência suprema, causa primária de todas as coisas, no entanto, facilmente deprenderemos que não se pode comparar uma criatura com Deus. O que podemos ler sobre os espíritos puros na Escala Espírita (LE, Pare 2a. Cap. I, 113) diz exatamente o que acabamos de inferir: “... Tendo alcançado a soma de perfeição de que é suscetível a criatura, ...”.
Seremos perfeitos ao final da jornada. Não ‘perfeitos relativos”, mas, simplesmente, “perfeitos”.  Como nos sabemos criaturas, não há margem para confusão.

Como Age a Reencarnação

Para avançar na senda evolutiva, temos que aprender, para aprender, temos que vivenciar experiências variadas, para vivenciar experiências variadas, temos que nos relacionar com a diversidade de outras criaturas que povoam o universo.
Temos que nascer ricos para aprendermos a usar o dinheiro visando o progresso da humanidade e não apenas o nosso, pobres para aprendermos que nos é possível ser úteis aos nossos irmãos, mesmo sem dispormos de recursos materiais, bonitos para sabermos como utilizar a beleza para influenciar os outros para o bem, com nosso exemplo de humildade e trabalho, feios para que saibam que a feiúra não é obstáculo às nobres ações, saudáveis para sermos motores das grandes realizações, doentes para mostrarmos, aos que se sentem fracos e incapazes, o quanto pode aquele que tem força de vontade. Se reencarnarmos em uma sociedade tranqüila, teremos muito a aprender, não mais nem menos, porém, que se nascermos em uma sociedade em guerra ou em outra situação calamitosa.
As características de cada reencarnação que temos, sejam elas raciais, familiares, econômicas, sociais ou religiosas, são sempre as mais adequadas ao estágio de evolução no qual nos encontramos, tendo sido cuidadosamente escolhidas pelos nossos protetores e guias espirituais visando nosso melhor aproveitamento.
Os Espíritos evoluem através de sucessivas vidas na carne e, por força da Lei da Causalidade, todas as ações cometidas por eles contrárias às Leis da Natureza farão com que vivenciem, em momentos posteriores, situações onde terão a oportunidade de reparar seus erros. São as chamadas expiações. Essas oportunidades são incontáveis, de modo a respeitar tanto a Lei da Causalidade quanto o Livre Arbítrio. Desse modo, se uma situação de vida destinada a oferecer ao Espírito uma oportunidade nova de reparar um erro não é aproveitada, surgirá outra, outra e outra mais, em sucessão interminável até que a diretriz da Lei seja cumprida e a harmonia seja estabelecida.
Outro tipo de experiência que os Espíritos vivenciam durante sua evolução são as chamadas provas, isto é, situações não antes vividas onde eles terão que aplicar a sabedoria e a bondade adquiridas até então para mostrar estarem em condição de aproveitar as lições nelas contidas.
Sejam provas ou expiações, as experiências que vivemos são, antes de tudo, lições que temos que aprender. Sempre que um método utilizado não funcionou, novo método de ensino é aplicado até que as lições sejam aprendidas. Não existe pecado, não existe punição. Tal percepção das leis de Deus é um resquício dos ensinamentos que tivemos quando seguíamos outras religiões. O que existe é aprendizado contínuo nos caminhos da evolução incessante.

A Rede Escolar de Deus

O Mestre dos Mestres costumava utilizar-se de acontecimentos do dia-a-dia, comportamentos sociais e personagens conhecidos para, por meio de paralelos ou alegorias, tornar a realidade espiritual compreensível ao povo.
Utilizando o mesmo método que Jesus usava, vamos aprofundar nosso entendimento da necessidade da reencarnação, pensando na instituição escolar humana, como fez o Codificador.
Antes de realizar nosso intento, porém, vamos, primeiramente, pinçar algumas questões de O Livro dos Espíritos, que nos ajudarão a montar nosso paralelo.

172. As nossas diversas existências corporais se verificam todas na Terra?
Não; vivemo-las em diferentes mundos. As que aqui passamos não são as primeiras, nem as últimas; são, porém, das mais materiais e das mais distantes da perfeição.

177. Para chegar à perfeição e à suprema felicidade, destino final de todos os homens, tem o Espírito que passar pela fieira de todos os mundos existentes no Universo? Não, porquanto muitos são os mundos correspondentes a cada grau da respectiva escala e o Espírito, saindo de um deles, nenhuma coisa nova aprenderia nos outros do mesmo grau. a) Como se explica então a pluralidade de suas existências em um mesmo globo?
 De cada vez poderá ocupar posição diferente das anteriores e nessas diversas posições se lhe deparam outras tantas ocasiões de adquirir experiência. 

Vamos, então, ao nosso paralelo. Todos sabemos que, até a criança chegar à Universidade há um longo caminho a percorrer e que, ao longo desse caminho, ela pode passar por diferentes instituições.
O Universo pode ser visto, dessa forma, como uma imensa rede escolar dirigida por Deus através de suas leis sábias e imutáveis. O dono dessa rede é infinitamente tolerante, justo e amoroso e não aceita nenhum outro resultado que não a formatura com louvor de todos os alunos que nela ingressam, dando a eles infinitas chances de recomeço. Se um deles fracassar em uma série por displicência, ele poderá repetir o ano quantas vezes for necessário, cada vez com alguns professores novos e outros antigos, com alguns colegas novos e outros repetentes com ele. Se algum não se adaptar ao método de uma escola, lhe será permitido mudar de escola, para alguma onde se aplique metodologia diferente daquela praticada na escola onde ele não conseguia aprender, podendo mudar de escola de novo e mais uma vez, até que se adapte e consiga progredir. Por mais que um aluno repita o ano e mude de escola, o dono da rede nunca desiste de vê-lo formado e sempre lhe oferece uma nova chance de recomeço.
As principais diferenças entre esse modelo e as instituições humanas são o fato de nenhum aluno ser jamais expulso da rede escolar de Deus e a certeza de que todos, sem exceção, serão levados da creche à pós-graduação, do estágio de simples e ignorantes ao da angelitude.  

A Escala Espírita e a Reencarnação

Em O Livro dos Espíritos, Parte II, Capítulo 1, Allan Kardec apresenta a Escala Espírita, uma classificação geral para termos uma idéia dos estágios pelos quais passa um Espírito em evolução.
No Capítulo III de O Evangelho Segundo o Espiritismo, Kardec classifica os mundos habitados da seguinte forma:

·         Mundos Primitivos: destinados às primeiras encarnações e experiências da alma humana.
·        Mundos de Expiação e Provas: Nesses mundos, o mal predomina. Os Espíritos aí encarnam para prosseguir na sua evolução, passando por provas e expiações, decorrentes de seu processo de aprendizado evolutivo. Dentre os Espíritos que encarnam em um mundo de provas e expiações há os que acabaram de sair da infância evolutiva, vindos de um mundo primitivo, os que se demoram no aprendizado, precisando de inúmeras reencarnações para aprender cada lição evolutiva e os “degredados” de outros mundos, “de onde foram excluídos em conseqüência da sua obstinação no mal e por se haverem constituído, em tais mundos, causa de perturbação para os bons.”
·         Mundos de Regeneração: Onde a alma penitente encontra a calma e o repouso e acaba por depurar-se. O Espírito ainda se acha sujeito às leis que regem a matéria; experimentando as mesmas sensações e desejos, mas liberta das paixões desordenadas e dos vícios. O amor e o reconhecimento de Deus predominam e o esforço evolutivo é constante. Ainda suportam provas, pois são essas não mais que mecanismos de ensino necessários à evolução. Sendo o Espírito ainda falível, no entanto, ocorre de alguns recaírem no erro, fazendo com que voltem aos mundos de provas e expiações para aprenderem pelo método mais árido aquilo que pelo bem recusaram aprender no ambiente de amor e paz.
 ·       Mundos Ditosos ou Felizes: onde o bem sobrepuja o mal. A felicidade predomina.
·      Mundos Celestes ou Divinos: habitação dos Espíritos mais evoluídos, onde reina exclusivamente o bem e o conhecimento da verdade.

Em um exercício de comparação, com base na Escala Espírita e na Classificação dos Mundos, podemos imaginar o seguinte enquadramento para a reencarnação dos Espíritos, durante o estágio no Reino Hominal. 

Categoria de Mundo
Progresso Acadêmico
Classes Predominantes de Espíritos
Primitivo
Educação Infantil
Início de Jornada e 7a classe:
Espíritos Simples e Ignorantes e Neutros.
Provas e Expiações
Ensino Fundamental
9a, 8a, 7a, 6a, 5a e 4a classes: Espíritos Perturbadores, Neutros, Pseudo-sábios, Levianos, Impuros, Benévolos e Sábios.
Regeneradores
Ensino Médio
7a, 5a,  4a, 3a e 2a classes:
Espíritos Neutros, Benévolos, Sábios, de Sabedoria e Superiores.
Ditosos ou Felizes
Curso Superior
3a e 2a classes:
Espíritos de Sabedoria e Superiores.
Celestes ou Divinos
Pós Graduação
1a classe:
Espíritos Puros.

Em nosso enquadramento mostramos que Espíritos de ordem mais elevada reencarnam em mundos menos evoluídos que os que lhes correspondem. Tais Espíritos são os gênios das ciências, das artes e das demais áreas do saber humano, além dos ditos santos das diversas tradições religiosas.
Chamamos particular atenção para os nundos primitivos, destinados às primeiras encarnações das almas que ingressaram no reino hominal, tornando-se Espíritos, após a conquista da consciência moral. Nesses mundos, em nosso entendimento, Espíritos neutros podem reencarnar para desenvolver a tendência pelo bem. Dotados de mais conhecimento que os simples e ignorantes eles poderão ensinar àqueles o que sabem, tornando-se líderes de comunidades, seus sacerdotes ou conselheiros.

A Evolução do Princípio Inteligente

Até agora, por simplicidade, falamos da necessidade da reencarnação pensando somente na fase em que estagiamos no reino hominal. A realidade, no entanto, não se limita desse modo.
Tudo na Criação está em contínua evolução. Evolui o Universo em sua expansão incessante, evoluem os astros, evoluem os seres animados e os inanimados.
Diz Santo Agostinho em O Evangelho Segundo o Espiritismo Cap III, item 19:

“... Ao mesmo tempo em que todos os seres vivos progridem moralmente, progridem materialmente os mundos em que eles habitam. Quem pudesse acompanhar um mundo em suas diferentes fases, desde o instante em que se aglomeraram os primeiros átomos destinados e constituí-lo, vê-lo-ia a percorrer uma escala incessantemente progressiva, mas de degraus imperceptíveis para cada geração, e a oferecer aos seus habitantes uma morada cada vez mais agradável, à medida que eles próprios avançam na senda do progresso. Marcham assim, paralelamente, o progresso do homem, o dos animais, seus auxiliares, o dos vegetais e o da habitação, porquanto nada na Natureza permanece estacionário. Quão grandiosa é essa idéia e digna da majestade do Criador! Quanto, ao contrário, é mesquinha e indigna do seu poder a que concentra a sua solicitude e a sua providência no imperceptível grão de areia, que é a Terra, e restringe a Humanidade aos poucos homens que a habitam!...”

Criado simples e ignorante, mas destinado à Angelitude, o princípio inteligente evolui em sua longa jornada, estagiando nos diversos reinos, habitando em diversas moradas, tornando-se mais e mais complexo, individualizando-se, conquistando a consciência, o livre arbítrio, adquirindo sabedoria e bondade até o potencial máximo de que foi dotado, tornando-se, finalmente, Espírito Puro.
Quando falamos em Necessidade da Reencarnação, não podemos nos esquecer, portanto, que nossa jornada se iniciou muito antes de ingressarmos no reino hominal. Tudo na natureza nasce, morre e renasce. A reencarnação é uma lei divina e é através dela que o princípio inteligente evolui das formas mais simples da criação às mais complexas.
Não dispomos de tempo neste estudo para explorar os mecanismos da evolução em tempos anteriores ao ingresso no reino hominal. Sabemos, no entanto, que os animais, plantas e minerais são todos tão mais evoluídos e sutis quando evoluídos e sutis são os mundos em que eles habitam. Não é difícil, portanto, concluirmos que todos os seres vivos e inanimados necessitam, de certa forma, reencarnar e o fazem do mesmo modo que o homem, migrando de um mundo para outro e permanecendo maior ou menor tempo em cada um, conforme sua necessidade de aprendizado e estágio evolutivo.
Assim, por exemplo, ninguém deve esperar que aquele cãozinho, inteligente e sensível, que nos faz companhia, venha a ter uma de suas próximas reencarnações aqui na Terra como ser humano. Não, ele não terá. Primeiro, sua alma terá de estagiar em diversos outros mundos, adquirindo raciocínio mais elaborado e desenvolvendo suas emoções, até que sua consciência desperte em plenitude e ele possa, dotado de livre arbítrio e responsabilidade, interagir de igual para igual com outros seres do reino hominal. O ápice de sua evolução como membro do reino animal se dará, portanto, provavelmente, em um mundo ditoso e não em nosso planeta de provas e expiações. Do mesmo modo, seu ingresso no reino hominal se dará em um mundo primitivo, tampouco ocorrendo em nosso orbe.
Se aquela alma, hoje no estágio de um cãozinho, um dia alcançará seu hoje dono na jornada evolutiva, isso não nos é possível saber. Cada ser evolui de forma diferente do outro, uns acertando mais e outros menos, uns mais rápido e, outros, mais devagar. Aquele que hoje aprende comigo poderá, amanhã, ser meu professor.

Conclusão

Fomos criados simples e ignorantes, mas destinados à perfeição. A Lei da Evolução rege todos os seres e todas as coisas. Para que o princípio inteligente possa evoluir, ele necessita ingressar na matéria e interagir com ela. O percurso evolutivo, do átomo ao arcanjo, é imenso, impossível de ser percorrido em uma única existência. 
Estamos, talvez, a meio caminho na senda evolutiva. Se, por um lado, nos sabemos ainda longe da perfeição, muito longe também estamos dos seres mais simples que habitam nosso planeta. Conquistas importantes já fizemos e, tendo-as feito, é mister que saibamos fazer delas o melhor uso. Possuímos consciência moral e raciocínio maduro, sendo, também, dotados de livre-arbítrio.
Empenhemo-nos, portanto, tanto quanto nos seja possível, na reforma íntima. Busquemos, a cada dia, sermos uma pessoa melhor que no dia anterior. Ao final de cada dia, ao término de cada ação, ao concluirmos cada comentário, saibamos nos calar e refletir sobre o que dissemos, sobre o que pensamos, sobre o que fizemos. Analisando continuamente nossos pensamentos, palavras e obras, disciplinaremos nossa conduta para torná-la uma conduta verdadeiramente espírita, uma conduta verdadeiramente cristã.
A evolução não é uma corrida de obstáculos, sequer uma corrida é. No entanto, que a constação de que temos a eternidade para evoluir não sirva para nos amolecer o ânimo, mas, antes, como estímulo para acelerarmos a marcha, de modo a podermos ajudar aqueles que ficaram para trás, praticando, desse modo, a verdadeira caridade cristã. 


Fonte: http://www.ieja.org/portugues/Estudos/Artigos/p_necessdadedaencarnacao.htm
 

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