“Só existe um problema filosófico
verdadeiramente sério: o suicídio. Julgar se a vida vale ou não a pena
ser vivida é responder a questão fundamental da filosofia.” – Albert
Camus (1913-1960)
A afirmativa acima é do Prêmio Nobel de Literatura de 1957 e se encontra no livro O Mito de Sísifo, cujo tema central é o suicídio.1
Se essa proposição parece exagerada, em sua essência guarda verdades,
que devem ser refletidas de forma séria e profunda. Não se pode negar
que, se não é o único “problema filosófico verdadeiramente sério”, é um
dos maiores, levando-nos a pensar em questões fundamentais como o
sentido da vida humana e a continuação do existir.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) lançou em setembro de 2014 um suplemento intitulado Preventing Suicide – a Global Imperative2 (em tradução livre, Prevenindo o Suicídio – um Imperativo Global).
São as estatísticas mais recentes sobre o tema, referentes ao ano de
2012, as quais revelam a magnitude do problema. Naquele ano, 804 mil
pessoas tiraram a própria vida, número que excede as vidas perdidas por
homicídio e guerras juntos e equivale a uma morte a cada 40 segundos.
Nesse número, obviamente, não são contabilizadas as tentativas, mas
somente as mortes consumadas. Em termos de tentativas, tem-se uma a cada
dois segundos.
Em números absolutos, o ranking
dos países é liderado pela Índia, totalizando número superior a 258 mil
mortes. O Brasil ocupa a preocupante oitava posição com quase 12 mil
suicídios por ano, média de 24 mortes por dia. Outros dados importantes
trazidos pela OMS indicam que se trata da segunda causa de morte entre
pessoas na faixa etária de 15 a 29 anos, ou seja, jovens em idade
produtiva. Os dados também revelam que 75 % de todos os suicídios de
2012 ocorreram em países pobres ou em desenvolvimento. Os números,
assim, são imperativos em comprovar a importância do tema e de que se
vive um verdadeiro problema filosófico e de saúde pública.
Mas afinal, por que tantas mortes? Por
que as pessoas cometem suicídio? Os suicidólogos, especialistas no
assunto, atestam que mais de 90% das pessoas que cometem suicídio são
portadoras de algum transtorno mental, o qual seria possível ser
diagnosticado e tratado. Na lista têm-se, em especial, os transtornos do
humor (depressão e transtorno afetivo bipolar), abuso de substâncias
ilícitas (álcool e drogas), transtornos de personalidade e
esquizofrenia. Transtornos dessa natureza aumentam os índices de
suicídio, sobretudo quando não há tratamento adequado. No entanto, não
se deve esquecer uma das maiores chagas da Humanidade: o materialismo.
Os Espíritos Luminares, que sob a
bandeira do Espírito de Verdade colaboraram na elaboração da Doutrina
Espírita, indicam que a luta contra o materialismo é um dever e uma
necessidade para a transformação moral da Humanidade. Allan Kardec, na
Introdução de O Evangelho segundo o Espiritismo, diz “que o materialismo, com o proclamar para depois da morte o nada, anula toda responsabilidade moral ulterior”.3
Despertar o ser para sua verdadeira essência, indicando sua natureza
espiritual sujeita às Leis de Causa e Efeito e à Lei da Reencarnação, é
tarefa das mais relevantes e que descortina um Novo Mundo e situa o
Homem como sujeito do seu destino na construção da felicidade.
“A incredulidade, a simples dúvida sobre
o futuro, as ideias materialistas, numa palavra, são os maiores
incitantes ao suicídio […]”.4 O Espiritismo, como Doutrina
Consoladora, transforma a crença em saber, dizima as dúvidas e vence o
materialismo, dando a conhecer as leis que regem o universo espiritual e
suas relações com o mundo corpóreo. A partir daí, foi e é possível
conhecer as graves consequências de pôr fim à própria vida. O capítulo
V, intitulado Suicidas, da segunda parte do livro O Céu e o Inferno,5 guarda importante material de estudo e desvenda o importante sofrimento post mortem.
O sofrimento vivenciado não é fruto de
castigo divino, pois não existe esse artigo nas Leis Universais. É
natural que o Espírito, ao se deparar com a realidade pós-túmulo e
entender que a vida ainda “pulsa”, mergulhe nos abismos da própria
consciência onde se encontram escritas as Leis de Deus.6
Transgredir as Leis de Deus é transgredir a própria natureza, causando
assim profundo sofrimento moral. O Espírito percebe que a morte
compreendida como extinção da vida não corresponde à verdade. A rigor, a
morte está inserida nela e é a porta para o retorno à Pátria da qual
saiu, voltou e sairá ainda na necessidade de evoluir sempre. Além disso,
existem as consequências biológicas da complexa relação espírito-corpo,
o qual, enquanto encarnado, se satura de fluido vital. Para que o
desligamento ocorra por completo, o Espírito deve extinguir totalmente o
fluido vital a fim de que possa dar continuidade à sua jornada como
Espírito desencarnado. Em Memórias de um Suicida, psicografia de Yvonne A. Pereira, há o seguinte esclarecimento:
[…] Será preciso que se desagreguem dele
[do suicida], as poderosas camadas de fluidos vitais que lhe revestiam a
organização física, adaptadas por afinidades especiais da grande mãe
natureza à organização astral, ou seja, ao perispírito, as quais nele se
aglomeram em reservas suficientes para o compromisso da existência
completa […].7
Daí as profundas e graves impressões sofridas pelo Espírito vinculado ainda ao corpo [1]físico
por ter atentado contra a própria vida de forma violenta. São
repercussões de ordem magnética que impactam o envoltório sutil do
Espírito ou corpo espiritual, ou seja, o perispírito. Dado que tal
envoltório corresponde à matriz biológica formadora do corpo físico,
pode haver implicações futuras. Dificuldades no intercurso existencial e
em encarnações posteriores, gerando limitações físicas e psíquicas não
são incomuns. Entram em ação as Leis de Causa e Efeito na necessidade de
reparar equívocos através da dor, maior aliada do processo evolutivo.
Eis o que afirma Léon Denis:
“Fundamentalmente considerada, a dor é uma lei de equilíbrio e educação”
e, assinala ainda, “necessidade de ordem geral, como agente de
desenvolvimento, condições do progresso”.[2]
Porém, em nenhum momento, o Espírito em sofrimento é abandonado à
própria sorte. As Leis de Deus agem sempre a favor do Espírito imortal,
acolhendo-o e aliviando suas dores para que possa progredir com
confiança e fé em si mesmo e no Pai de infinita misericórdia. Assevera
Jesus: “Bem-aventurados os que choram, pois serão consolados. […] pois
que é deles o Reino dos Céus”. (Mateus, 5:4, 6 e 10.)
A espiritualidade e a religiosidade são
as ferramentas mais eficazes de prevenção ao suicídio e também as mais
consoladoras. A Ciência caminha nessa direção e são inúmeras as
pesquisas indicativas de menores taxas e atitudes mais negativas em
relação a esse ato.[1] A data de 10 de setembro,
indicada pela OMS, corresponde ao Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio.
Seja ela um momento de reflexão para todos e, igualmente, de alçar uma
prece em favor desses Espíritos em sofrimento, buscando a figura meiga
do Nazareno…
[…] Desci, mas desci muito aos reinos inferiores…
Despertando no túmulo, escutei Os gritos
da aflição de alguém que muito amei E que muito amo ainda… […] um amigo
não esquece a dor de outro amigo que cai… Antes de me altear à Celeste
Alegria, Ao sol do mesmo amor a Deus, em que te enlevas, Vali-me, após a
cruz, das grandes horas mudas,
E desci para as trevas, A fim de aliviar a imensa dor de Judas.
O trecho acima do poema Amor e perdão,
de Maria Dolores, psicografia de Francisco Cândido Xavier, descreve
o diálogo do Mestre de Nazaré e Maria Madalena após o histórico dia do
Calvário.[2] O Cristo, nos três dias que antecederam a “ressurreição”, buscou Judas, seu amigo amado, após o ato impensado do suicídio…
Jesus nunca nos esquece!
REFERÊNCIAS:
[1]PIMENTA, Danilo. A postura camu-siana perante o suicídio físico. Fragmentos de Cultura, Goiânia, v. 22, n. 3, p. 281-288, jul./set. 2012.
[2]Preventing suicide: a global imperative. 2014
[3]KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. 131. ed. 6. imp. (Edição Histórica.) Brasília: FEB, 2015. Introdução, it. IV, Resumo da doutrina de Sócrates e Platão, subit. 9.
[4]____. Cap. 5, it. 16.
[5]O céu e o inferno. Trad. Guillon Ribeiro. 61. ed. 2. imp. (Edição Histórica.) Brasília: FEB, 2015. pt. 2, cap. 5.
[6]KARDEC, Allan. O livro dos espíritos. Trad. Guillon Ribeiro. 93. ed. 2. imp. (Edição Histórica.) Brasília: FEB, 2016. Q. 621.
[7] PEREIRA, Yvonne A. Memórias de um suicida. Pelo Espírito Camilo Cândido Botelho. 27. ed. 6. imp. Brasília: FEB, 2016. Cap. Vale dos suicidas, p. 27.
[8] DENIS, Léon. O problema do ser, do destino e da dor. 32. ed. 6. imp. Brasília: FEB, 2015. Cap. 26, p. 347-348.
[9] KOENIG, Harold. Espiritualidade no cuidado com o paciente. São Paulo: FE Ed., 2005. Cap. 1, p. 21.
[10] XAVIER, Francisco C. Coração e vida. Pelo Espírito Maria Dolores. São Paulo: Ideal, 1994. Cap. 14.
TERAPIA DO PERDÃO: UMA PROPOSTA DE PAZ
ResponderExcluirPerdoar é um caminho que se trilha, uma jornada que, embora possa beneficiar o próximo, proporciona o crescimento para aquele que perdoa. Pode ter início através de um acordo que fazemos com nós mesmos, pela opção de transformar todas as experiências, mesmo as mais dolorosas, em fontes de crescimento.
Quando é possível ser exercitado com aquele que nos feriu, ou nos fez sentir dessa forma, ainda melhor, porquanto promove o diálogo e a possibilidade de crescimento mútuo. Quando isso não seja possível, mesmo assim promove o bem estar, ao proporcionar a libertação da raiva e do rancor acumulados, que se transformam em verdadeiros venenos emocionais para quem os conduz, levando não raro a doenças psicossomáticas. Fora isso, permite descobrir nossos pontos vulneráveis e aprimorá-los.
Muitos confundem o perdão com a negação das emoções, mas para perdoar não é necessário negá-las, mas entende-las e elaborá-las de uma forma mais profunda, respeitando o tempo em que permaneçam conosco, mas sem valorizá-las demasiadamente.
Ponto importante é poder diferenciar o indivíduo das suas atitudes; o que está em questão não é julgar o outro, mas perceber o quanto sua atitude pode ter nos magoado. Também não significa concordar com comportamentos equivocados, mas promover o reconhecimento da humanidade do outro, que passa pelo reconhecimento da nossa própria humanidade: assim como erramos e possuímos sombra, isso ocorre também com o outro.Quando começamos a não desejar o mal do outro, já damos um passo importante para perdoá-lo. Não será necessário que a amizade ou a convivência retornem ao mesmo patamar, mas caso isso ocorra ainda melhor, porquanto demonstra que o conteúdo emocional foi bem trabalhado. O registro dos fatos pode até permanecer na memória, mas a diferença é que não trará mais o conteúdo emocional perturbador, que nos faz ressentir o já vivido, retornando ao passado.
Por esses e outros motivos, a terapia do perdão transforma-se em fonte de paz para o indivíduo, libertando-o do medo de amar, um dos grandes algozes da humanidade.
Iris Sinoti - Terapeuta Junguiana
Jornal de Estudos Psicológicos nº 47 | Julho e Agosto |
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