ÚLTIMOS
E PRIMEIROS (27)
Ev.
Cap. XX – Item 2
(...)
os últimos serão os primeiros e os primeiros serão os últimos. Mateus, 20:16.
No contexto do comportamento
histórico-sociológico, o ser humano prefere utilizar-se dos primeiros lugares,
aqueles que lhe podem oferecer maior destaque no conjunto em que se movimenta,
com essa atitude agradando ao ego sempre necessitado de emulação para
desempenhar a tarefa que lhe diz respeito.
Não raro, dominado pelas
paixões derivadas da necessidade do prazer e da posse, que lhe parecem
constituir metas únicas, transforma a existência num calvário de lutas
intérminas, porquanto as ambições em crescendo não lhe facultam a paz nem o
preenchimento interior, que são indispensáveis à vida feliz.
Educado para o triunfo na
sociedade, mediante propostas hedonistas, a sua vitória deve ser disputada a
qualquer preço, não importando as consequências que possam advir dessa
filosofia utilitarista de efeitos perturbadores.
Atingido o patamar que
constituía o objetivo central dos seus esforços e interesses, não se pode
furtar ao vazio existencial ou ao continuado empenho para ter mais, tornar-se
conhecido, dominador, como se os infortúnios, as enfermidades, a velhice e a
morte não o pudessem atingir.
A existência física
parece-lhe ser a saga de realizações externas, o acumular de louros e aplausos,
num vaivém ininterrupto, cansativo e desgastante.
Os vitoriosos de um dia, no
entanto, passam, como sucede com os indivíduos de todas as camadas nas
diferentes luas que travam.
Essa conduta ilusória
responde por transtornos psicológicos muito graves e danos espirituais de
libertação penosa.
O mundo é educandário,
oficina para atividades nobres e nunca uma ilha de sorrisos e plenitude, ou um
palco de tragicomédias que deleitam apenas por um momento.
O Evangelho de Jesus é um
repositório de ensinamentos convidando à mudança de entendimento da finalidade
existencial.
Sem jamais combater a posse
ou o prazer que se derivam dos esforços dignos e dos objetivos de serviço à
Humanidade, Jesus sempre conclamou aqueles que O escutavam ao progresso
mediante o trabalho, à dignidade por meio do auxílio recíproco, demonstrando,
no entanto, a transitoriedade de todas as coisas ante a perenidade do Espírito.
Sendo possuidor de recursos
incomparáveis, aplicou-os pelo bem dos outros, nunca se permitindo humilhar ou
menosprezar os carentes, ou entregando-se ao desperdício, ao abuso do poder, à
exploração de outrem.
Vivendo intensamente o
mundo, este com suas imposições, às vezes, arbitrárias, deu curso à meta que
trazia: a instalação do Reino de Deus nas mentes e nos corações humanos.
Não seja de estranhar a sua
informação de que nesse Reino de
justiça, os que se exaltam, se glorificam e desfrutam das comodidades e
honradas terrestres, sempre nos primeiros lugares, serão os últimos, enquanto que aqueles
que sofrem que jamais experimentaram as concessões terrestres, os tesouros da
cobiça e do orgulho, serão os
primeiros.
Paradoxalmente, os eleitos
pelos homens, que deles esperam colher as migalhas que sobram nas suas mesas
elegantes e fartas de poder transitório e prestígio, salvadas as exceções
compreensíveis, acumulam os frutos da avareza, do crime silencioso e oculto, da
traição, do suborno, da astúcia desenfreada. Eles próprios sabem da conduta que
mantém, de como são interiormente e do seu desinteresse pelo progresso da
sociedade e bem-estar do seu próximo. O egoísmo que neles predomina cega-os
para a realidade existencial e para as mínimas expressões de compaixão e de
misericórdia em favor dos deserdados da fortuna, os denominados párias
sociais...
É natural que, após a
embriaguez dos sentidos e o demorado letargo na glória, despertem para a
realidade que difere do que lhes aprouve viver no mundo, anestesiando a razão e
torcendo a óptica de observação do seu irmão situado economicamente em degrau
mais baixo, quiçá pela sua indiferença ou perversidade.
À luz da Psicologia
Profunda, o texto evangélico em epígrafe trabalha contra a sombra do
poder-prazer, diluindo o ego ambicioso e perverso ante as claridades
diamantinas do Subconsciente das suas altas responsabilidades de edificação da
criatura humana.
A coragem de Jesus é
incomparável, porquanto diante da alucinação dominante nos Seus dias, formulou
a Parábola dos trabalhadores da última hora, enfrentando a presunção farisaica
e o orgulho hebreu de considerar-se privilegiado por Deus, em face do seu comportamento
monoteísta e das inúmeras Revelações de que a raça foi instrumento. Em
contrapartida, eles não se davam conta de que a abundância de informações que
esclarecem constitui pesada carga de responsabilidade moral para aqueles que
lhe recebem o benefício.
Nasceu Jesus em Israel de
forma que se cumprissem as profecias; no entanto, Ele não pertence a um povo, a
uma raça, a uma época, sendo de todas as nações e de todos os tempos, sem
compromisso específico com quaisquer que Lhe queiram disputar a dominação.
Ele asseverou com severidade
que tinha outras ovelhas que não eram daquele rebanho, confirmando a Sua
independência e total liberdade de ação em relação a todas as criaturas
humanas.
Os profetas foram os
primeiros a trazerem a notícia da vida espiritual, da Justiça Divina, das
consequências dos atos morais em relação ao próprio ser. Cumpriram com as suas
missões abrindo espaços luminosos para aqueles que viriam mais tarde. São
considerados trabalhadores da primeira hora, na visão da Psicologia Profunda à
Parábola do Mestre, por haverem suportado a invernia dos sentimentos e a
canícula das paixões desequilibradas. Enfrentaram o solo áspero dos corações e
não desistiram mesmo quando as dificuladades se lhes apresentavam quase
impossíveis de superadas.
Logo depois, vieram os
intelectuais, seus herdeiros, os mártires, os Pais da Igreja, os missionários
do bem, os lutadores da solidariedade humana, que haviam haurido, nos
ensinamentos recebidos, os exemplos e os estímulos para continuarem trabalhando
a terra ingrata dos sentimentos terrestres, nessa luta incessante contra a
sombra coletiva poderosa, mesmo que a contributo da própria vida, conforme
ocorrera com o seu Mestre.
Por fim veio a Revelação
Espírita, que faz desaguar no oceano do mundo espiritual todas as propostas da
imortalidade, que é desvelada pela mediunidade, da Justiça Divina atestada pela
reencarnação e confirmada pelos fatos e pela experiência da fé raciocinada e
lógica.
Os tempos modificaram-se,
mas as lutas, embora com aspectos diferentes, prosseguem terrificantes e de
efeitos cruéis. As atrações do prazer estão multiplicadas pelos veículos da
Informática, o abuso dos sentimentos torna-se quase hediondo, as facilidades
para o vício e o desvio de rota multiplicam-se a cada instante, e o discípulo
sincero da Boa–nova apresenta-se como um estranho no palco das excentricidades
hodiernas.
Parece mesmo não haver lugar
na sociedade para quem abraça a Doutrina de Jesus desvelada dos enigmas e
libertada das mazelas e desvios que sofreu através dos séculos...
Sabendo, no entanto, que o
tempo é escasso e as circunstâncias não são favoráveis, uma empatia superior
domina o sentimento desse servidor devotado, impulsionando-o ao prosseguimento
do esforço de autotransformação para melhor, superando as marcas do passado, as
heranças primitivas e trabalhando com acendrado amor. Os seus objetivos
centram-se no serviço do Bem e mesmo vivendo os condicionamentos do mundo,
psicologicamente mantém-se em termos de consciência de si mesmo, administrando
as funções da máquina física sem castrar-se ou fugir dos compromissos que lhe
dizem respeito, não dependendo dos caprichos terrestres, porque vinculado
emocionalmente à Vida sem limite.
Compreendendo o convite de
Jesus para que sirva em quaisquer condições que apareçam, nunca desanima no
serviço, reforçando as convicções espirituais quanto maiores testemunhos surjam
pelo caminho iluminativo.
Sucede que muitos desses
trabalhadores, ora engajados na renovação, retornaram ao proscênio terrestre
para darem cumprimento aos deveres que ficaram interrompidos na retaguarda, em
outras reencarnações fracassadas, quando, atraídos pelos ouropéis abandonaram a
charrua, embriagando-se de prazeres e enlouquecendo mais tarde de remorso,
quando então solicitaram a bênção do recomeço e da reparação... Repetem hoje as
experiências malogradas anteriormente.
Sem qualquer desconsideração
pelos diferentes credos religiosos e filosofias existentes, aos espíritas
conscientes das suas responsabilidades – aqueles mesmos que se equivocaram e
agora recomeçam em condições melhores – cabem neste momento graves compromissos
que não podem nem devem ser postergados, quais sejam os de proclamar a Era Nova
e demonstrar pela lógica e pelo bom senso, assim como através dos fatos da
mediunidade dignificada, a existência do mundo causal, a anterioridade do
Espírito ao corpo, os incomparáveis recursos saudáveis defluentes da conduta
correta, dos pensamentos edificantes, da ação do bem ininterrupto.
Comprometido com os Imortais
que têm a tarefa de apressar estas horas, o trabalhador convidado pela
consciência lúcida do dever é estimulado a superar o ego e investir as suas
melhores energias na vivência e divulgação da Mensagem evangélica sem jaça.
Simultaneamente, deverá
preparar a sociedade terrestre para a reencarnação de milhões de missionários
do bem e da caridade, que logo mais brilharão no mundo em sombras como estrelas
polares apontando os novos rumos para a Humanidade cansada de gozo e prazer,
sequiosa de paz e de renovação.
Nessa oportunidade que
chega, espocarão as luzes da verdade desbastando as trevas teimosas da
ignorância, os preconceitos doentios da vaidade, os prejuízos morais
estabelecidos pelos gananciosos, e o amor triunfará dos caprichos da libido,
expressando-se sem tormentos nem angústias, em formoso contributo para a
felicidade geral.
É inevitável, portanto, que
os últimos sejam os primeiros, e os primeiros sejam os últimos, conforme
expressou Jesus na Sua delicada parábola.
do livro Jesus e o Evangelho à Luz da Psicologia Profunda
por Joanna de Ângelis e Divaldo Pereira Franco
Nenhum comentário:
Postar um comentário