Na composição integral do ser humano, a ciência identifica as
dimensões física, psíquica, social e espiritual como sendo, basicamente,
as principais que possuímos. Mesmo que em algumas abordagens
filosóficas e antropológicas apareçam mais ou menos dimensões,
trataremos, por ora, dessas quatro.
No geral, o desejo humano tende a buscar somente o lado positivo de
cada uma dessas dimensões, às vezes num afã quase neurótico por saúde,
beleza, alegria, euforia, êxtase etc. Assim, se estamos em um ambiente
social, queremos nos sentir amados e acolhidos, buscamos ser bem vistos
pelas pessoas que estão por perto. Se num ambiente profissional,
desejamos o reconhecimento por nossos feitos, os feedbacks positivos dos
superiores etc. Também queremos – às vezes exigimos – aceitação do
nosso parceiro afetivo quando estamos numa “bad”, queremos elogios
quando tiramos boas notas ou apresentamos um bom trabalho acadêmico e
por aí vai.
Se fizermos um honesto exame de consciência, muito provavelmente nos
identificaremos com alguns ou muitos desses exemplos. Entretanto, a
proposta que faço aqui é para olharmos com mais receptividade para
situações tão humanas quanto a alegria, o prazer, o riso, a paz. Por que
não acolher também a tristeza, a frustração, a raiva? Como diria o
poeta Terêncio: “nada do que é humano me é estranho”; podemos alargar o
significado dessa frase reconhecendo que tudo o que é humano pode
agregar, trazer mistérios reveladores, apresentar novas realidades que
antes estavam encobertas pela luz da harmonia.
Não precisamos buscar sofrimentos; inevitavelmente as dores se
apresentam a todas as realidades humanas. Contudo, é possível fazer
escolhas dentro das circunstâncias mais opacas e densas que somos
levados a provar vez ou outra. A perda, o luto, o fracasso, a inveja, a
vergonha e tantas outras emoções não precisam receber nossa invariável
resistência e rejeição. Se adotarmos posturas de negação frente aos
sentimentos menos agradáveis, provavelmente eles persistirão e se
agravarão ao longo do tempo.
A proposta, assim, é lançar um novo olhar para as emoções negativas, e
não apresentar resistência a elas. Assim como acolheríamos a alegria,
podemos receber a tristeza como uma companheira que tem algo a dizer
nesse determinado momento. Quanto tempo essa hóspede irá permanecer?
Talvez o tempo da aprendizagem do novo, o tempo da quebra de um tijolo
dentro do peito, quem sabe o espaço entre você e a maturidade, entre
você e a verdadeira liberdade interior.
Se aparecer a inveja, o ciúme, permita-se um olhar profundo para
dentro de si e pergunte-se: o que essas emoções têm a me dizer? Pergunte
à angústia, à ansiedade: onde querem me levar? Que lugares dentro de
mim devo olhar com mais cuidado, onde devo depositar mais amor, ternura,
em quais cantos escuros devo me demorar com mais paciência? No final
das contas, essas emoções tão facilmente rejeitadas, podem ser amigas
que o auxiliarão a encontrar respostas e a despertar o lado criativo que
há dentro de você.
Os momentos de passagem tendem a ser desafiadores. Angustiamo-nos
quando não enxergamos o outro lado do caminho, quando falta o horizonte e
os consolos. Entretanto, se nos dispusermos a abaixar nossas
resistências ao que é inesperado e desagradável, haverá a oportunidade
de descobrir que, quando estamos na sombra, podemos observar a luz com
mais nitidez. E então, o novo se abrirá em forma de crescimento,
maturidade, humildade, paz etc.
Coragem! A aventura do autoconhecimento certamente te levará para
vales, montanhas, lagos e abismos, mas é um desafio que te fará mais
autêntico, maduro e livre.
Por Milena Carbonari Krachevski
Fonte: Psicologias do Brasil
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