Jesus proclama bem-aventurados, cidadãos do reino dos céus, agora e aqui mesmo, todos aqueles que são pobres, ou desapegados, dos bens
terrenos, não pela força compulsória das circunstâncias externas e
fortuitas, mas sim pela livre e espontânea escolha espiritual; os que,
podendo possuir bens materiais, resolveram livremente despossuir-se
deles, por amor aos bens espirituais, fiéis ao ensino do Cristo: “Não
acumuleis para vós bens na terra — mas acumulai bens nos céus”.
Essa libertação da escravidão material
pela força espiritual supõe uma grande experiência e iluminação interna.
Ninguém abandona algo que ele considera valioso sem que encontre algo
mais valioso. Quem não encontrou o “tesouro oculto” e a “pérola
preciosa” do reino dos céus não pode abandonar os pseudos tesouros e as
pérolas falsas dos bens da terra. É da íntima psicologia humana que cada
um retenha aquilo que ele julga mais valioso.
O verdadeiro abandono, porém, não consiste em uma fuga ou deserção externa, mas sim em uma libertação interna. Pode o milionário possuir externamente os seus milhões, e estar internamente liberto deles — e pode, também, o mendigo não possuir bens materiais e, no entanto, viver escravizado pelo desejo de os possuir, e, neste caso, é ele escravo daquilo que não possui, assim como o milionário pode ser livre daquilo que possui. Este possui sem ser possuído — aquele é possuído pelo que não possui.
O principal é saber possuir ou não
possuir. Ser rico ou ser pobre são coisas que nos acontecem, de fora —
mas a arte de saber ser rico ou de ser pobre, é algo que nós produzimos,
de dentro. O que nos faz bons ou maus não é aquilo que nos acontece,
mas sim o que nós mesmos fazemos e somos.
Ser rico não é pecado — ser pobre não é virtude.
Virtude ou pecado é saber ou não saber ser rico ou pobre.
Naturalmente, quem é incapaz de se
libertar internamente do apego aos bens materiais sem os abandonar,
também, externamente, esse deve ter a coragem e sinceridade consigo
mesmo de se despossuir deles, também, no plano objetivo, a fim de
conseguir a “pobreza pelo espírito”, isto é, a libertação interior.
Aquele jovem rico do Evangelho, ao que parece, era incapaz de possuir
sem ser possuído; por isso, o divino Mestre lhe recomendou que se
despossuísse de tudo a fim de não ser possuído de nada — mas ele falhou.
E por isso se retirou, triste e pesaroso, “porque era possuidor de
muitos bens”. Possuidor? não — era possuído de muitos bens.
Quem não sabe possuir sem ser
possuído, fez bem em se despossuir de tudo. Mas quem sabe possuir sem
ser possuído pode possuir. Não raro, o ato externo do despossuimento é
condição preliminar necessária para a libertação interna.
Quem fez dos bens materiais um fim, em
vez de um meio, pratica idolatria, porque “ninguém pode servir a dois
senhores, a Deus e ao dinheiro”. Quem serve é servo, escravo, inferior.
Quem serve ao dinheiro proclama o dinheiro seu senhor e soberano e a si
mesmo servo e súdito. Mas quem obriga o dinheiro a servir-lhe é senhor
do mesmo, porque usa o dinheiro como meio para algum fim superior.
Quem serve a Deus “em espírito e verdade” pode ser servido pelo dinheiro e por outros bens materiais.
Bem-aventurados os pobres pelo
espírito, os que, pela força do espírito, se emanciparam da escravidão
da matéria. Deles é o reino dos céus, agora, aqui, e para sempre e por
toda a parte, porque, sendo que o reino dos céus está dentro do homem,
esse homem leva consigo o reino da sua felicidade aonde quer que vá...
O nosso pequeno ego humano é muito
fraco, e necessita de ser escorado por muitos bens materiais para se
sentir um pouco mais forte e seguro, mas o nosso Eu Cristificado é tão
forte que pode dispensar essas escoras e muletas externas e sentir-se
perfeitamente seguro pela força interna do Espírito.
Todo o problema está em saber ultrapassar a fraqueza e insegurança do ego e entrar na força e segurança do EU espiritual...
Bem-aventurado o que empobrece o ego — pela riqueza do espirito!...
Dele é o reino dos céus!...
Fonte: Amigos de Jesus
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