Eternidade

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sexta-feira, 3 de novembro de 2017

A trajetória do Cristianismo


A força e a influência do Cristianismo primitivo foram consequências dos ensinos e dos exemplos de Jesus, manifestados através da caridade, da fraternidade e do amor.

Há muito o espírito do Mestre parece ter-se ausentado da religião que domina há vinte séculos um reino que é deste mundo e não mais um sonho superior e divino.

Jesus limitava-se a orar nos sítios solitários e a meditar nos templos naturais que têm por colunas as montanhas e por cúpula a abóbada celeste, de onde o pensamento se eleva facilmente ao Criador. Agora, de há muito, a simplicidade natural foi substituída pelo fausto, pelos cânones e pelas encíclicas.

O Mestre jamais pretendeu dominar os reis e os poderosos, mas vivenciar, neste mundo, a humildade e o amor, exemplificando entre os homens o que ensinava. Por força das leis divinas, tanto as almas encarnadas quanto os Espíritos livres, todos têm vida eterna e se aproximam de Deus, o Criador, na medida da evolução e progresso alcançados.

O Cristo, na sua passagem pela Terra, nada deixou escrito. Naturalmente houve importantes motivos para que assim procedesse.

Seus ensinos foram sempre verbais, em todos os lugares por onde transitou. Durante cerca de meio século, após a tragédia do Calvário, continuava a tradição cristã oral e viva, pregada pelos apóstolos, homens simples, com poucos conhecimentos, mas assistidos e iluminados pelo Mestre amado. As primeiras narrações escritas só aparecem dos anos 60 aos 80, sendo a primeira a de Marcos, seguida das de Mateus e Lucas, todas constituídas de trechos fragmentários, em língua hebraica, nas quais houve sucessivos acréscimos, como no Evangelhode Lucas, que se tornou definitivo no fim do século I, entre os anos 80 e 98.

Já o Evangelho de João, que emigrara para a cidade de Éfeso, só apareceu entre os anos 98 e 110, com estrutura diferente dos três anteriores, denominados sinópticos, no qual, além da língua grega, percebe-se a influência da filosofia de Sócrates e Platão.

Os quatro Evangelhos citados foram os únicos reconhecidos pela Igreja Católica, mas um maior número de outros, cerca de vinte, vieram à luz. O Cristianismo primitivo, baseado nos ensinos e exemplos de Jesus, e seguido pelos apóstolos em todo o século I, a partir dos séculos II, III e IV, foi-se alterando de tal maneira que se afastou de suas formas primitivas, ensinadas e exemplificadas pelo Cristo aos seus apóstolos e discípulos.

Durante os 300 anos após o primeiro século, a tradição cristã não mais permaneceu a mesma, afastando-se cada vez mais dos seus fundamentos e práticas do tempo de Jesus e de seus discípulos.

Com o Evangelho de João a crença cristã evolui, ao substituir a ideia de um homem honrado, que se tornou divino, pela certeza de que um ser divino se apresenta como um homem. Depois da proclamação da divindade do Cristo, no século IV, e da introdução no sistema eclesiástico do dogma da Trindade, no século VII, diversas passagens do Novo Testamento foram modificadas, para que exprimissem a concordância com os novos acréscimos (ver João, 1:5 e 7).

Existem manuscritos,“na Biblioteca Nacional, na de Santa Genoveva, e na do mosteiro de Saint- Gall”, em que o dogma da Trindade está acrescentado à margem e, mais tarde, foi intercalado no texto. (Cristianismo e Espiritismo, León Denis. Nota complementar n. 3, Ed. FEB.)

Outro fato de grande importância, ocorrido no ano 325, foi a aliança dos cristãos com constantino, pretendente ao trono imperial romano, em disputa com outro candidato. Vencida a disputa, Constantino prestigiou os aliados cristãos, que se deixaram iludir pelo poder temporal, passando de perseguidos a perseguidores, em diversas situações.

Santo Hilário, Santo Agostinho, São Jerônimo e outros luminares da Igreja afirmavam que os Evangelhos, além da letra, encerram um sentido oculto, que era preciso descobrir, para dar-lhe a interpretação espiritual. Infelizmente a advertência não foi considerada.

A letra e o cerimonial acabaram prevalecendo sobre o essencial. O objetivo de Jesus, ao pregar às criaturas simples “o Evangelho do Reino dos Céus”, era pôr ao alcance de todos, apesar da dificuldade de entendimento de seus ouvintes, o conhecimento de Deus, como Pai, cuja voz se fazia ouvir na consciência de todos, e a imortalidade da alma.

Entretanto, esses ensinos básicos, transmitidos verbalmente nos primeiros tempos do Cristianismo, foram alterados posteriormente, sob a influência de outras correntes, que agitavam o mundo cristão, e espalhados por todo o Império Romano.Para terminar com as discussões sobre a natureza de Jesus, em diversos concílios, São Jerônimo recebeu, em 384, a missão de redigir uma tradução latina do Velho e do Novo Testamento.

Essa tradução, denominada Vulgata, tornou-se ortodoxa como norma das doutrinas da Igreja. Entretanto, essa tradução oficial, que deveria ser definitiva, foi retocada emodificada em várias épocas, por determinação dos pontífices.

Antes da Vulgata, latina, existia a versão grega das Escrituras, denominada Septuaginta. O pensamento do Cristo subsiste nos Evangelhos, nos textos sagrados, apesar de mesclados com elementos e opiniões introduzidos, através dos séculos, por vários concílios da Igreja, visando a predominância de seus conceitos.

Com a Nova Revelação, o Consolador prometido e enviado aos homens pelo Cristo, que sabia das confusões que ocorreriam sobre seus ensinos, tornou-se muito mais fácil escoimar-se a Doutrina do Mestre das obscuridades que a envolveram no decorrer dos séculos.

O Consolador, o Espiritismo, traz de volta o Cristianismo primitivo, com o acréscimo do conhecimento de coisas novas, como a doutrina das reencarnações, a vida neste mundo e sua continuação nas esferas espirituais.

O ideal do Reino de Deus e de sua Justiça, cultivado pelos primeiros cristãos, induzidos pelos ensinos de Jesus, foi mais tarde substituído pelas profecias do fim do mundo e do juízo final, tomados ao pé da letra, levando muitos crentes a acreditarem na salvação individual mediante vantagens materiais oferecidas às organizações religiosas.

Essa e várias outras práticas instigadas aos cristãos deram motivo à discordância de muitos, inclusive levando Martinho Lutero a formular os motivos que deram origem à Reforma.

Diz Emmanuel em A Caminho da Luz que [...] Os postulados de Lutero constituíram, antes de tudo,modalidade de combate aos absurdos romanos, sem representarem o caminho ideal para as verdades religiosas.

Ao extremismo do abuso, respondia com o extremismo da intolerância, prejudicando a sua própria doutrina. Mas o seu esforço se coroou de notável importância para os caminhos do porvir.1

A verdadeira doutrina do Cristo acha-se enunciada nos Evangelhos, no seu todo, mas não em partes que possam contrapor-se por interpretações isoladas. O essencial é a compreensão de que Deus é o Criador universal, o Pai, como o definia Jesus.

A vida é eterna para todos os Espíritos, permitindo o Pai, a cada um, realizar em si mesmo o “Reino de Deus”, ou seja a perfeição, pelo desprendimento dos bens materiais, pelo amor a Deus sobre todas as coisas e pelo amor ao próximo como a si mesmo, com o perdão das ofensas. O Sermão da Montanha resume os ensinos de Jesus de modo simples, mas em traços indeléveis.

Nele a lei moral é expressa de forma admirável, para que os homens aprendam a elevar-se moralmente pelas virtudes humildes:

Bem-aventurados os pobres de espírito (isto é, os Espíritos simples e retos), porque deles é o Reino dos Céus.
– Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados.
– Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados.
– Bem-aventurados os que são misericordiosos, porque alcançarão misericórdia.
– Bem- aventurados os limpos de coração, porque esses verão a Deus. (Mateus, 5:1 a 12; Lucas, 6:20 a 25.)2



1XAVIER, Francisco C. A caminho da luz.
item Renascença religiosa, p. 211.
2DENIS, Léon. Cristianismo e espiritismo.

Fonte: Espiritismo na Rede

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