Eternidade

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quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Agenda mínima para evoluir - Alteridade


- I -
 

Alteridade, palavra que só agora começa a se tornar mais conhecida, principalmente nos meios espíritas.
 
De forma resumida podemos dizer que ela representa o respeito que devemos ter para com todos, além da disposição para aceitar e aprender com os que são e pensam diferente de nós. É também a construção da fraternidade apesar das divergências, respeitando-as e procurando aprender com as diferentes opiniões. Mas vivenciar o valor da alteridade não significa deixar de discutir, debater, questionar. A discussão, o debate e o questionamento são saudáveis quando se respeita o outro e a sua maneira de ser e de pensar.
 
A alteridade nos ajuda a abrir caminhos para uma compreensão mais elevada sobre tudo. É o mais importante mecanismo para o crescimento do homem como ser social, que pode levá-lo a interagir pacífica e beneficamente com tudo que o cerca. É, sem dúvida, o veículo capaz de conduzir a humanidade para a tão esperada nova era.
 
A postura alteritária nos leva a ver todos com bons olhos, lembrando as palavras de Jesus: “Se os teus olhos forem bons, todo o teu corpo será luminoso; se, porém, os teus olhos forem maus, todo o teu corpo estará em trevas.” (Mateus 6:22 e 23)
 
A pessoa que vivencia a alteridade passa a ser mais fraterna em todos os sentidos, deixando de criticar, julgar, agredir... E esse tipo de atitudes deixa o ser em paz consigo mesmo, com a humanidade, com a vida.
 
Aí você poderá contestar dizendo que isto torna a criatura alienada. Mas há grande diferença entre analisar – com vistas ao próprio aprendizado e também no intuito de ajudar, caso seja viável – e julgar ou criticar. As posturas de julgamento e crítica geralmente denotam uma idéia de superioridade, porque ao criticarmos o outro estamos querendo diminuí-lo, para que a nossa “grandeza” fique mais visível. Com tais atitudes, que têm como combustível o orgulho e a vaidade, estamos enviando uma vibração negativa ao objeto da nossa crítica, seja ele uma pessoa, uma instituição ou uma nação, já que as instituições e as nações são formadas por pessoas. Por exemplo, você vê alguém caminhando sobre a grama de uma praça para encurtar caminho e pensa: “Que criatura mais sem educação!”.
 
Nesse ato de criticar intimamente a atitude daquela pessoa, você está gerando uma vibração negativa, ou seja, “energia psíquica” de teor negativo. Parte dessa energia fica em você mesmo, seu gerador, e outra parte alcança a pessoa que pisou a grama para cortar caminho. Por outro lado, se registrar o ato errado, mas respeitando a diferença do outro não criticá-lo, estará fazendo um bem a si mesmo e deixando de fazer mal a outrem. Mas digamos que, agindo com alteridade e com afeto, você entende que deve falar-lhe, alertando-o para o erro que está cometendo, fá-lo-á então de forma a não humilhá-lo, encontrando a melhor maneira de ser, junto àquela pessoa, uma presença benéfica. Mas se esse alerta for inviável, poderá enviar-lhe uma vibração fraterna junto com a ideia de que não se deve pisar a grama, para que esse tipo de vibração, alcançando o alvo, possa induzi-lo a não mais praticar esse tipo de ações, atuar sobre ele como fator indutor.
 
- II -
 
Desenvolvendo a alteridade, respeitando completamente a maneira de ser dos outros em seus erros, equívocos e até mesmo em suas maldades, lembrando que todos somos seres em diferentes faixas evolutivas, tornamo-nos mais leves, mais de bem com a vida, mais alegres e também mais saudáveis. E se entendermos e vivenciarmos verdadeiramente a alteridade e a afetividade, faremos uma prece pelos que estamos observando em erro e lhes direcionaremos vibrações positivas, indutoras de ações mais corretas.
 
Mas há um ponto importante a ser percebido em sua totalidade e de forma não distorcida. Diz respeito à crítica. Como o ser humano, ou grande parte da humanidade, tem a tendência de pular de um extremo para o outro, é bem provável que muitos, ao abraçarem as idéias da alteridade, caiam nesses extremos e passem a adotar a omissão ou a conivência como sendo posicionamentos alteritários.
 
Ocorre que exercer a faculdade da crítica faz parte do crescimento do ser humano. Só que há dois tipos de crítica, uma é saudável, a outra não.
 
Na crítica saudável observamos, analisamos, buscando entender os porquês, confrontando tudo com o que sabemos e o que entendemos que seja o melhor e o mais correto, sempre na intenção do aprendizado e visando roteirizar para nós próprios os melhores modelos. Podemos também realizar essas análises, visando de alguma forma colaborar para que sejam corrigidos ou minimizados os erros que vamos encontrando em nossas apreciações. Se acrescermos a esse tipo de crítica os valores da afetividade, havemos sempre de encontrar a melhor maneira de ajudar, de ser presenças benéficas onde estivermos, nem que essa ajuda se dê tão somente através de uma prece ou de uma vibração positiva. Isto equivale a uma atmosfera interna de boa vontade, de olhar tudo e a todos com bons olhos, a desenvolver uma vibração positiva. Isto é benéfico para quem age dessa forma, para os que o circundam e também interfere ou interage de forma positiva com as próprias circunstâncias.
 
Na crítica saudável podemos dialogar com tranquilidade, debater nossos pontos de vista, trocar ideias, estar abertos para aprender com os outros, enfim, participar ativamente das situações, sempre visando o bem geral.
 
No tipo de crítica não-saudável, desenvolvemos uma ambiência interna pesada, do contra, sempre dispostos a encontrar erros em torno de nós. Posturas assim são geradoras de energismo pesado, desagregador, além de fomentar orgulho e vaidade em quem as vivencia.
 
Também é digno de nota o fato de que nos meios espíritas é muito fácil desenvolvermos um estado de crítica negativa com relação às religiões e a outros saberes, tendo em vista o universo de conhecimentos transcendentais que o Espiritismo nos proporciona. Esse tipo de procedimento é também gerador de orgulho. Mas uma postura alteritária é niveladora, ajudando a eliminar o orgulho, por nos propiciar entendimentos mais amplos, pelos quais podemos perceber a importância de todos os demais saberes, filosofias e religiões na evolução da humanidade.
 
- III -
 
Outro dia, quando fazia a caminhada matinal, ao passar diante de um condomínio em construção, um homem – vigia noturno da obra – lia a Bíblia para uma mulher.
Meu primeiro impulso foi pensar: “Um evangélico querendo converter alguém, logo cedo”. Mas, lembrando-me da alteridade, mudei meu estado de espírito com relação àquela situação e iniciei um discurso de censura para comigo mesma. Logo em seguida, porém, recordei-me das lições que venho aprendendo com esta Agenda Mínima, enquanto a vou escrevendo. Então, ao invés da auto-censura, preferi “olhar” a cena com uma visão diferente, e fiquei comovida com o que vi: uma pessoa pobre, certamente sem instrução, ocupando-se em repassar a outrem os ensinamentos de Jesus, quando poderia estar comentando o crime da véspera que ainda circulava na mídia e na boca do povo.
Olhei-os então com outros olhos e enviei-lhes uma vibração afetuosa. Segui caminho, sentindo-me feliz, desse tipo de felicidade que sentimos quando olhamos o outro com afeto, com alteridade e com humildade.
Assim, por tudo que podemos observar em nós e em torno de nós, é possível perceber a importância da alteridade em todos os relacionamentos. Nos meios espíritas ela se torna uma postura de vanguarda, sinalizando um modelo de convívio para o novo tempo, o mundo de regeneração.
A afetividade e a alteridade também são importantes para a paz. Ver os outros com olhar alteritário minimiza quaisquer razões para a violência. Vê-los com olhar afetivo dilui as vibrações agressivas e desfaz impulsos violentos.
O escritor e palestrante espírita Alkíndar de Oliveira, pinçou algumas observações do espírito Ermance Dufaux, do livro Reforma Íntima sem Martírio, psicografado por Wanderley S. Oliveira, nas quais vale a pena refletir:
“Aprender a discordar sem gostar menos, de nossos companheiros.”
“Aceitar cada pessoa como é, procurando entender os “porquês” dos incômodos que sentimos com esse ou aquele coração.”
“Pensar sempre com bondade sobre quaisquer pessoas, em quaisquer situações.”
“Ajuizar, com isenção de ânimo, o valor das idéias alheias.”
“Onde houver duas ou mais pessoas reunidas... ali estará o conflito. Cabe a nós aprender a administrar os conflitos interpessoais e isto só será possível se tivermos alteridade.”
E que viva o amor, em todas as suas manifestações.

Extraído do Blog: http://conscienciaevida.blogspot.com/  

sexta-feira, 27 de novembro de 2015

CAPÍTULO 7 - AS RELAÇÕES COMO BASE PARA O EXERCÍCIO DOS SENTIMENTOS




CAPÍTULO 7 - AS RELAÇÕES COMO BASE PARA O EXERCÍCIO DOS SENTIMENTOS
(Gelson L. Roberto)
Um homem e uma mulher falam na solidão de nosso ser. (Gaston Bachelard)

Sabemos que muito da nossa criatividade depende de um "fluir" emocional que enriquece e abre novas possibilidades para as várias situações da vida. O sentimento é uma das fontes da vida psíquica e as relações são o seu palco fundamental.

A espontaneidade, a receptividade, a capacidade de não misturar os conteúdos pessoais com a função exercida, a flexibilidade, capacidade de empreendimento, entre outras, são fatores de ordem intrinsecamente emocional. Muitas situações vividas apresentam inúmeros problemas que tem por causa fatores emocionais. Assim, torna-se de vital impor¬tância o estudo e a reflexão sobre os relacionamentos e sua dinâmica emocional.

Joanna de Angelis afirma que "os sentimentos expressam a capa¬cidade que possui o ser humano de conhecer, de compreender, de sentir e compartir as emoções que o vitalizam nas suas diversas ocorrências existen-ciais .

Ficamos muito distantes do que seja realmente amar, expressão máxima do sentimento. O sentimento constitui em muito o problema do nosso tempo e a benfeitora aponta que os relacionamentos são um convite ao amor a fim de alcançar a plenitude existencial.1

Precisamos, então, tê-lo mais perto de nós, saber lidar com ele e buscar seus tesouros, pois se o intelecto é como uma luz a iluminar de fora o que toca, a fim de discriminar, o sentimento é a própria luz que cada ser carrega e que se impõe naturalmente como o brilho de um diamante.

Primeiramente, podemos dizer que as relações sao movidas por paixões e sentimentos. Muitas pessoas quando estão apaixonadas pen¬sam que estão envolvidas pelos melhores sentimentos, mas isso não é bem assim. Quantas pessoas matam em função de suas paixões? Quan¬tos traem seus princípios e relações por causa das paixões? Quantas re¬lações apaixonadas perdem sua força depois de alguns confrontos com a realidade? O desejo nos atrai e nos impele a muitas coisas, mas só o sentimento consegue estabelecer uma relação com profundidade. Lem¬bremos: intensidade não quer dizer profundidade.

A paixão é um estado de longa duração, de forte intensidade, com a tendência de sair da realidade. Quando estamos sob o seu efei¬to, tendemos a perder a dimensão dos sentimentos e suas distinções. O sentimento serve para organizar e dar uma direção para a paixão. Como nos diz O Evangelho Segundo o Espiritismo, "o dever íntimo do homem está entregue ao seu livre arbítrio: o aguilhão da consciência, esse guardião da probidade interior, o adverte e o sustenta, mas permanece, frequentemente, impotente diante dos sofismas da paixão. O dever do coração, fielmente observado, eleva o homem; mas, esse dever, como pre¬cisá-lo? Onde se detém? O dever começa precisamente no ponto em que ameaçais a felicidade ou a tranquilidade do vosso próximo; termina no limite que não gostaríeis de ver ultrapassado em relação a vós mesmos"?

Nesse sentido, é importante estabelecermos uma diferença entre eros e sentimento. Eros é uma força e não um sentimento. Tem raízes no desejo e se refere ao princípio da união, do apego a, do apego por, do envolvimento que une, da conexão.

Uma força universal e impessoal que, como nos diz Hillman3, pode se apresentar de forma inumana e demoníaca, seja como compulsão sexual ou como eros cosmogónico, que garante a integridade do universo. Sendo assim, há pessoas que podem ter muito eros (muito desejo, apetite sexual) e pouco sentimen¬to, e outras com pouco eros e um sentimento bem-desenvolvido. Aliás, muitas vezes até se opõem, basta olhar para os estados de perturbação que eros provoca para vermos como isso é comum. Tanto que muitos amantes unem-se sem nenhum sentimento. Por isso, Joanna assevera que o amor é permanente e o Eros é transitório e que o amor deve se utilizar de Eros sem que se lhe submeta.4

O Livro dos Espíritos também nos coloca, na questão 939, que "há duas espécies de afeições: a do corpo e a da alma e, frequentemente, se toma uma pela outra. A afeição da alma, quando pura e simpática, é durável; a do corpo perecível. Eis porque, frequentemente, aqueles que crêem se amar, com um amor eterno, se odeiam quando a ilusão termina"? Compreende-se que o sentimento não é um fenómeno único e absoluto, possuindo vários elementos que interagem num movimento dialético entre matéria e espírito.
A FUNÇÃO SENTIMENTO
Jung refere que o sentimento é, "em primeiro lugar, um processo que se realiza entre o eu e um dado conteúdo, um processo que atribui ao conteúdo um valor definido no sentido de aceitação ou rejeição (prazer ou 'desprazer), mas também um processo que, abstraindo do conteúdo mo¬mentâneo da consciência ou de sensações momentâneas, pode aparecer como que isolado, como 'disposição de ânimo' (humor). O sentimento é, portanto, também uma espécie de julgamento, mas que se distingue do julgamento intelectual, por não visar ao estabelecimento de relações conceituais, mas a uma aceitação ou rejeição subjetivas. A valorização pelo sentimento esten-de-se a cada conteúdo da consciência, seja de que espécie for.

Aumentando a intensidade, surge um afeto, isto é, um estado sentimental com inervações corporais sensíveis. O sentimento se distingue do afeto por não provocar inervações corporais sensíveis... Como o pensamento, o sentimento é uma função racional, porque, conforme a experiência o mostra, os valores em geral são atribuídos segundo leis da razão que, por sua vez, também gover¬nam a formação dos conceitos. Orientándose a atitude global do indivíduo pela função do sentimento, falamos de um tipo sentimento"?

Todo relacionamento humano é permeado por algum tipo de sen¬timento, sendo uma função da consciência que avalia. Através desse processo podemos dar um valor às experiências situacionais e pessoais. Em cada relação recebemos e damos cargas de sentimento, o que não quer dizer que esses sentimentos sejam sempre positivos. Pois sempre sentimos algo por alguém, mesmo que seja desprezo. Assim, nas rela¬ções, o sentimento pressupõe uma capacidade de afetar o mundo e de valor e o objeto ao sujeito, favorecendo ser capturado por um sistema subjetivo de valores. Por isso, podemos dizer que a função sentimento é uma função do relacionamento. E Joanna completa dizendo que os relacionamentos dependem do nível de consciência daqueles que estão envolvidos.7

Temos então um aspecto que é o amor em seu processo evoluti¬vo, que se abre e se exercita nas relações, e a consciência, orientando e estabelecendo uma atitude frente às relações de conformidade com seu nível. Em O Evangelho Segundo o Espiritismo vamos encontrar no texto sobre "A Lei de Amor" a dimensão evolutiva do sentimento: "O amor resume inteiramente a doutrina de Jesus, porque é o sentimento por exce¬lência, e os sentimentos são os instintos elevados à altura do progresso rea¬lizado. No seu início, o homem não tem senão instintos; mais avançado e corrompido, só tem sensações; mais instruído epurificado, tem sentimentos; e o ponto delicado do sentimento é o amor, não o amor no sentido vulgar do termo, mas este sol interior que condensa e reúne em seu foco ardente todas as aspirações e todas as revelações sobre-humanas". 8

Podemos perceber que o amor vai se construindo em níveis cada vez mais sublimes. Joanna diz que quando aparente, o amor é de caráter sensualista, buscando apenas o prazer imediato. Isto faz com que o sen¬timento se debilite, se entorpeça ou se envenene, gerando toda espécie de frustração. Já quando real, estruturado e maduro, a benfeitora afirma que é um sentimento que sabe esperar, que estimula e renova. Expressão que não se satura, sem altibaixos emocionais, esse amor real une as pes¬soas, alimentando o corpo e despertando o eu profundo. 9

Joanna também é consistente quando afirma que em nossa ca¬minhada de vida também passamos por fases nas formas de vivenciar o amor, "o infantil, que tem caráter possessivo, o juvenil, que se expressa pela insegurança, o maduro, pacificador, que se entrega sem reservas e faz-seplenificador"? Também afirma que há uma fase intermediária entre a insegurança e a plenificação que se estabelece no comportamento de dar e receber, procurando libertar-se da consciência de culpa.

Quando nossas relações são primitivas ou mesmo quando a ca¬pacidade do espírito ainda é bruta no seu sentir, a função sentimento csiauciccc uma avaliação que tende a ser reducionista e limitada, traba¬lhando mais com certas reaçóes do tipo aceitar-rejeitar, gostar-desgostar ou bom-ruim. Já quando mais elaborada, ela estabelece uma forma de apreciação sutil de valores e sistemas cada vez mais complexos que se apoiam numa hierarquia racional, seja ético, social, estético ou nas rela¬ções em geral. Assim, ao fazer julgamentos, a função sentimento busca coerência e sistematização, pesando valores, comparando nuanças, re¬lacionando qualidades, contextualizando, diferenciando a situação da pessoa e sua intenção e avaliando a importância dos elementos para to¬mar decisões. Mesmo no nível primitivo, ele busca essa coerência, ainda que numa lógica mais limitada. Por isso, ela é uma função racional.

O que está em jogo é que essa função racional vai partir de certos pressupostos de acordo com sua condição psicológica. Quando Joanna de Angelis afirma o estágio infantil do amor, estabelece-se uma lógica presa nessa imagem da necessidade de ser amado e, consequentemente, uma atitude obsessiva, dominadora, por estar centrado apenas em si e não também no ser amado. O resultado são comportamentos de am¬bição e posse e a perda de uma objetividade na relação. Afloram senti¬mentos inquietantes de insegurança, expressos nos ciúmes, incertezas, ansiedades, cobranças, entre outros.

O sentimento, quando desenvolvido como função, estabelece a ordem e a lógica do amor. E bem trabalhado capacita a uma relação confiante e libertadora. Esta lógica difere da racionalidade intelectiva, pois às vezes elas até se opõem. Digamos que a função sentimento é a razão do coração, que muitas vezes não é compreendida pela cabeça. Esses processos lógicos que ocorrem com o sentimento podem ser de diferentes formas, lineares ou complexos. Depende do desenvolvimento que cada um tem dessa função.

Em todo relacionamento temos a oportunidade de trabalhar e exercitar vários aspectos do sentimento. Nas relações, vários desses aspectos são acionados e são fundamentais para a compreensão e capacidade de estabelecer um contato pleno e construtivo. Alguns sentidos são operados pelo sentimento. As noções de tempo e de feeling são próprias da função sentimento. Quando o pensamento está dissociado do sentimento, somos levados a agir certo na hora errada ou, ao contrário, no momento adequado agirmos de forma incompatível. Por exemplo, numa situação afetivamente sensível não conseguimos falar nada de interessante e até mesmo acabamos sendo desajeitadamente indelicados. (!om esses dois elementos, de tempo e de feeling, estabelecemos um ritmo favorável ao momento e a sua importância conferindo a cada coisa Seu devido lugar, transformando uma situação ou uma história banal numa história de alma - significativa, encadeada, íntima e específica.

Não podemos, então, entender o sentimento de uma forma simplificada e reducionista, em uma mera alternativa do gostar-desgostar. Essa função é um processo complexo que, segundo Hillman,10registra a qualidade e o valor específico das coisas. Ela faz a exploração e amplificação de nuanças e tons.

Os sentimentos são a base de todo processo relacional, desde a atração, no seu princípio, entre moléculas e astros, até esse poder aglutinador envolvendo a família espiritual. Opõem-se à indiferença e conferem as condições essenciais para uma postura ética. Assim, a vida moral é determinada pelo nível de consciência e capacidade do sentimento de cada um. Onde falta sentimento e compreensão, a rigidez e o moralismo arbitrário tomam lugar.

O Espiritismo favorece uma melhor reflexão e oferece uma anatomia dos sentimentos, possibilitando maior clareza e profundidade em relação a eles.

O evangelho refere que a obediência é o consentimento da cabeça enquanto que a resignação é o consentimento do coração. Confundimos essas virtudes como uma negação da vontade e do sentimento, mas o fato é que elas são a própria expressão da vontade e do sentimento. Uma força ativa e amorosa que nos coloca em harmonia com o Todo. A indignação também é uma força ativa que reflete uma reação de oposição quando essa harmonia e consciência são feridas, ou seja, quando o ser humano se confronta com uma incompatibilidade com sua natureza. A indignação, por ser uma reação agressiva, não quer dizer que compactue com a violência, pois aí já é cólera que nada mais é do que o orgulho ferido. Na medida em que tomamos conhecimento desses aspectos, podemos fazer um entendimento mais realista de nossa condição interna. Podemos dizer que o espiritismo nos instrumentaliza a lidar com a razão do coração.

Esses exemplos reforçam a idéia que o sentimento, longe de ser um movimento de passividade e amolecimento, é um processo profundo de entendimento. Uma compreensão de si, do outro e da vida.

Para fins ilustrativos, elegemos três classes da vida afetiva para serem comparadas entre si: a emoção, a paixão e o sentimento.

Importa diferenciar melhor também essas três classes da vida afetiva. Cada uma tem seu movimento, sua manifestação e sua modalidade de ser. A emoção é passageira, isolada e é movida pela modalização do poder. Eros é um estado mais durável, cuja manifestação é episódica ou contínua e está baseado no querer. O amor é durável ou permanente, sua manifestação é contínua, mesmo que às vezes sutil, e é movida pelo saber. Sendo o sentimento no seu aspecto modal um saber, o saber abrange o querer e o poder. Com isso, as emoções e paixões podem ser substitutas do amor, levando ao desejo egoístico do querer apaixonado ou ao poder irracional da emoção que afloram, demonstrando a incapacidade daquele indivíduo em amar. Jung dizia que o poder aparece sempre quando somos incapazes de amarmos. Este sempre aparece quando alguém abdica ou é incapaz de se relacionar pelo amor. O amor faz sentir sua presença sem se impor, tem uma força que se apresenta naturalmente com uma capacidade infinita de cativar e transformar.

Vimos até aqui que o sentimento estabelece relações entre o sujeito e o objeto e entre o objeto e o sujeito. Essas relações aparecem de duas formas: na forma de uma carga emocional, provocada pela relação do indivíduo com sua experiência íntima diante de determinado objeto e na forma de valores, pela relação do indivíduo com conteúdos pré-estabelecidos que expressem um julgamento em relação ao mundo. É um processo que dá e recebe cargas de sentimento com e através de um entendimento estabelecido. Também podemos concluir até aqui que em torno das relações humanas, estamos lidando com três forças poderosas: Eros, a emoção e o amor.

A função sentimento tem estado reprimida e desconsiderada pela nossa sociedade, provocando reações bem-preocupantes, como a delinquência, a solidão, o erotismo exagerado, etc. O sentimento foi inferiorizado a tal ponto que só pode entrar pela porta dos fundos. Quando isso ocorre, tudo parece incerto, pois os sentimentos foram abalados. Temos medo do nosso próximo, medo de sermos atacados, sentimos um anseio vago que buscamos sem saber onde e, com isso, nos tornamos egoístas e superficiais, lutando, odiando, caluniando e gerando muito sofrimento. Nas relações de trabalho enfrentamos muitas dessas condições.

Atualmente, vemos o quanto nos afastamos do sentimento e de suas formas, e tentamos buscá-lo desesperadamente em movimentos desarticulados. Isto nos levou a buscar situações artificiais para o contato com os sentimentos. Organizamos, por exemplo, grupos pretensamente terapêuticos, nos quais se estabelecem vivências que forçam estados alterados de afetos e emoções. E uma espécie de "institucionalização" de um espaço e de tempo em que é permitido "sair do sério", que estranhos toquem nosso corpo, que libertemos raivas e desejos. Usamos de subterfúgios ou de drogas, buscando estímulos cada vez maiores para "sentir intensamente"... Tudo não deixa de ser uma tentativa desajeitada da alma humana, em seu recôndito esconderijo, num esforço para ser reconhecida e recuperar sua sensibilidade.
ANIMA E ANIMUS
Até o momento, procuramos reflerir o que é o sentimento, seus processos, a sua função e implicações nas relações. Antes de prosseguir¬mos, importa reconhecer quanto a identidade do sujeito é um produto das relações com os outros. Neste sentido, somos povoados de outras personagens internas em nossa história. Assim como, também povoado de pessoas que nos acompanham na nossa solidão, em momentos de dúvidas e conflitos, dor e prazer. Desta maneira, estamos sempre acom¬panhados por pessoas que vivem conosco permanentemente. Essa afir¬mação é ainda mais real quando levamos em consideração a realidade espiritual com nossos acompanhantes em Espírito.

Com isso, queremos dizer que além das pessoas que nos acompa¬nham externamente, temos um universo interno de pessoas que partici¬pam de nossa vida. Nossa personalidade é formada por diversas outras pessoas no nosso mundo interno e que muitas vezes permanecem in¬conscientes. Não nos damos conta que estamos repetindo e reproduzin¬do estilos e papéis que tem a ver com vínculos arcaicos em que outros personagens jogam por nós. Podemos relacionar esses "personagens in¬ternos" com o conceito de complexo na psicologia analítica.

Os complexos são elementos dinâmicos do sistema psíquico que têm funções próprias dentro desse sistema e se formam a partir de um conjunto autónomo de impulsos, agrupados em torno de ideias e emo¬ções, carregadas de energia. Todo complexo tem um núcleo que é o arquétipo. Assim, para cada complexo podemos reconhecer um arqué¬tipo em seu centro. O ego, a sombra, o complexo materno/paterno, entre outros, são exemplos de complexos que se formam como condição de nossa realidade psíquica.

Entre os complexos existentes, não podemos deixar de nos referir às estruturas relacionais que representam aspectos da alma do indivíduo - anima e animus. Como foi colocado, eles são complexos relacionais porque possuem em sua função essa qualidade e papel na psique. A ani¬ma (aspecto feminino no homem) e o animus (aspecto masculino na mulher) representam o outro (elemento contrassexual) dentro de nós. Segundo Jung, na medida em que integramos parcialmente este oposto dentro de nós, tornando-o consciente, aumentamos a nossa capacidade pessoal de lidar com a complexidade das outras pessoas.

Como arquétipos, eles representam forças essenciais da alma que organizam e apreendem a realidade. São os princípios universais ào yin eyang, em suas qualidades femininas e masculinas. Enquanto comple¬xos, são personificações pessoais relativas ao contexto histórico e reen-carnatório em que vivemos. Ou seja, imagens e funções que refletem conteúdos e experiências internalizadas do masculino e feminino.
Sabemos que o Espírito não tem sexo no sentindo estreito que entendemos e que em sua natureza ele é tanto feminino quanto mas¬culino, precisando experimentar essas duas realidades em seu processo evolutivo. Quando em nossa posição egoica assumimos uma polaridade masculina, nossa dimensão feminina estará mais inconsciente forman¬do uma personalidade parcial dentro da psique e, assim também, quando nosso ego c mais feminino, nosso universo masculino não se perde e se apresenta como uma imagem no nosso inconsciente.

Desse modo, diferentemente da condição de macho e fêmea que nos marca sexualmente, nossa identidade de género é extremamente complexa e de uma composição quase infinita de nuanças entre a di¬mensão masculina e feminina. O Espírito pode ter um corpo masculi¬no, mas com acentuada marca feminina e vice-versa sem que isto deter¬mine invariavelmente sua preferência sexual.
Angelis refere que Jesus conseguiu harmonizar essas duas nature¬zas e "ninguém como Ele, conseguiu essa perfeita identificação doyange do yin, provando ser o Espírito mais elevado que Deus ofereceu ao homem para servi-lhe de modelo e guia".11

Como o Self representa a totalidade do ser, reconhecemos que a anima e o animus são forças de conexão do Self numa relação de com¬plementação e compensação. Ou seja, reconhecemos neles aspectos im¬portantes para que a psique possa se relacionar plenamente com si e com o mundo. Portanto, a importância desses dois complexos ou arquétipos é que eles possuem para a psique essa função relacional. Para Jung, a ani¬ma e o animus, enquanto arquétipos, possibilitam a entrada ao incons¬ciente coletivo e a experiência com o Self, são psicopompos, ou seja, guias da alma para a viagem interior ao que é mais essencial e fundamental em nós. E também, como complexos, guardam as imagens masculinas e femininas que vão influenciar nas escolhas de nossos parceiros e nas relações humanas.

Todos estes integrantes do nosso mundo interno estão presentes na hora de qualquer ação, na realização de uma tarefa. Por isso, nosso ser individual nada mais é que um reflexo, no qual a imagem do espelho refletida é a de um "eu" que aparenta unicidade, mas que é composto por inumeráveis marcas de falas, presenças de modelos, etc.

Dessa forma, o relacionamento é uma necessidade inerente a todo indivíduo. É na relação com o outro que aprendemos a interagir social¬mente e que contatamos com as nossas dificuldades e limitações, bem como potencialidades a serem desenvolvidas. Onde nosso eu e nossos complexos da anima e do animus estarão ativados, nos colocando em coníronto com nossas imagens internas, necessidades e sentimentos que devem ser trabalhados.
Pessoas convivem e trabalham com pessoas, e reagem a estas nesse contato: comunicam-se, simpatizam e sentem atrações, antipatizam e sentem aversões, aproximam-se, afastam-se, entram em conflito, com¬petem, colaboram, desenvolvem afeto.

Assim, um olhar, um sorriso, um gesto, uma postura corporal, representam formas de relação entre as pessoas. Mesmo quando alguém vira as costas, fica em silêncio ou se mostra frágil, fraco, isso também é interação e têm um significado, pois comunica algo aos outros. Não há processos unilaterais na interação humana, tudo o que acontece no relacionamento interpessoal decorre de duas fontes: eu e o outro.

Essas reações voluntárias ou involuntárias constituem o processo de relação humana, em que cada pessoa na presença de outra pessoa não fica indiferente a essa situação de presença estimuladora. O processo de relação humana é complexo e ocorre permanentemente entre nós, sob forma de comportamentos manifestos e não manifestos, verbais e não verbais, pensamentos e sentimentos.

Isso nos remete a importância do reconhecimento dos aspectos sombrios da nossa personalidade, das questões internas de nossa anima e animus que refletem nossa condição ainda imperfeita e que são inva¬riavelmente projetadas nas relações com o outro. Para Jung, a modéstia é uma necessidade para chegarmos a nossa imperfeição, "e é exatamente esse reconhecimento consciente e essa consideração que são necessários onde quer que se estabeleça um relacionamento humano. Um relacionamento humano não se baseia na diferenciação e na perfeição, pois estas apenas enfatizam as diferenças ou trazem a tona o oposto exato; ele se baseia, isso sim, na imperfeição, naquilo que é fraco, indefeso e carente de apoio — a própria origem e razão da dependência. A perfeição não precisa dos outros, mas a fraqueza sim, pois ela procura apoio e não enfrenta o parceiro com qualquer coisa que possa forçá-lo a uma posição inferior e até mesmo hu¬milhá-lo. Essa humilhação pode ocorrer muito facilmente quando o alto idealismo representa um papel demasiado proeminente. Talvez isso pareça ser muito simples, mas as coisas simples sempre são as mais difíceis. Na vida real, exigem a grande arte de ser simples; portanto, a aceitação de si mesmo ê a essência do problema moral e a prova dos nove e de toda a perspectiva de vida da pessoa". 12

Agora podemos entender de que forma animalanimus atuam em nossas vidas práticas. Anima é a figura feminina no inconsciente do ho¬mem. Manifesta-se através dos humores: irritação, depressão, incerteza, insegurança, suscetibilidade, observação rancorosa e venenosa, frieza e indiferença, quando negativa. Também realiza um jogo intelectual de enigmas, formando um diálogo neurótico que impede o contato com a vida. Pensa tanto a respeito da vida que não consegue vivê-la, perdendo toda a espontaneidade e faculdade de comunicação.

Ela é a guia, mediadora entre o mundo interior e o Self. Responsá¬vel pela forma adequada de lidar com a natureza: por exemplo, escolha da companheira certa. E a anima que ajuda a discernir os fatos escon¬didos no inconsciente e sintonizar a mente com os valores interiores positivos. Possibilita a fé na vida.

Segundo a visão clássica, possui quatro estágios:

1) Eva - relacionamento puramente instintivo e biológico;

2) Helena (Fausto) - nível romântico e estético;

3) Virgem Maria - o Eros elevado à grandeza da devoção espiritual;

4) Sofia - a sapiência, a sabedoria que transcende até mesmo o sentido e a pureza.

Para integrar e desenvolver a anima, é necessário que o homem leve a sério seus sentimentos, humores, expectativas e fantasias, fixando--as de alguma forma: na literatura, arte, etc. Depois, examiná-la tanto ética como intelectualmente, considerando sempre essas manifestações como reais. Quanto mais distante o homem estiver de seu mundo in¬terior, mais difícil é sua relação com os sentimentos e mais literal será a sua relação com o mundo. A literalidade e a relação concreta com o mundo representam uma perda do contato com sua anima. Por exem¬plo, por não conseguir contatar com meu mundo interior e discernir meus sentimentos, projeto-os num cargo, num carro esportivo e fico excessivamente ligado ao culto do corpo.

Como bem define Hillman, "desenvolvimento do corpo não signi¬fica cultura muscular, ou tratá-lo e curti-lo com se fosse um objeto, aper¬feiçoá-lo em técnicas de judo, caratê, ou em habilidades sexuais. Devemos salientar uma diferença sempre esquecida - existente entre corpo e carne. A carne é ao mesmo tempo o opositor e companheiro secreto do ego. Atitudes mentais quanto à carne produzem sexo mental, egoísmo sexual, pornogra¬fia, e a imagem de nós mesmos passa a ser a do músculo bem treinado e enriquecido com vitaminas"}0

Quanto mais a mulher interior for representada nos sonhos ou nas fantasias por imagens do coletivo como modelos da moda ou cine¬ma, maior será a evidência de que a alma desse homem é coletivamente comum e igual à de todo mundo. No dizer de Hillman, "quanto mais engraçadinha a anima, menos bonita a alma. Pelo fato de expressarem minha capacidade de responder e de interiorizar, elas também mostram formas de desdobramento de minha vida religiosa. Se a minha alma for jovem demais, ou então muito fria ou materialista, ou ainda muito crítica, ê certo que haverá distorções correspondentes em minha vida religiosa"}*

O animus é a figura masculina no inconsciente da mulher. Não se manifesta sob a forma de fantasias ou inclinações eróticas como a anima, mas como uma convicção sagrada.

O animus nunca aceita exceçóes: Ou ele me ama ou não me ama... Não quer dizer que sua opinião seja equivocada. No entanto, raramente se enquadra numa determinada situação individual. É uma opinião que parece razoável, mas está fora de propósito. O que acontece é que muitas vezes a mulher já parte de um pressuposto interno dado pelo animus; assim, mesmo que a sua lógica esteja certa, como parte de um princípio equivocado, a conclusão acaba sendo equivocada também. É muito comum, então, a mulher ter um tipo de preconceito inconsciente contra ela ou contra os outros. Fantasias como "não vai dar certo", "essa roupa não fica bem em mim", "ele não me ama", são jogos internos feito pelo animus negativo.

Aparece através de pensamentos oníricos, dos desejos e julgamentos que definem as situações como elas deveriam ser, afastando a mu¬lher da vida. Pode aparecer como o demónio da morte (ideias e desejos de morte), assaltante, assassino personificado, reflexões semiconscientes frias e destruidoras que invadem a mulher durante as horas da madrugada, especialmente quando ela deixou de realizar uma obrigação ditada pelos sentimentos. Tece uma espécie de rede de pensamentos como brutalidade, indiferença, conversas vazias, idéias silenciosas, obstinadas e más.

Positivamente, enquanto função, é ele que lança uma ponte para o Self através da atividade criadora. Para integrá-lo e desenvolvê-lo é necessário que a mulher enfrente a realidade em lugar de deixar-se possuir por ela. O animus possibilita iniciativa, coragem, honestidade, objetividade e sabedoria espiritual.

Possui quatro estágios:

1) Atleta musculoso (ex. Tarzan) - personifica a agressividade (ação) como força física;

2) Herói de guerra / homem romântico / poeta - personifica a iniciativa e a capacidade de planejamento e ação;

3) Professor / orador - torna-se o verbo, o condutor do verbo;

4) O sábio (ex. Gandhi) - encarnação do Logos, aquele que leva a verdade espiritual.

No estágio elevado, o animus relaciona a mente feminina com a evolução espiritual de sua época. Mediador de uma experiência religiosa através da qual a vida adquire um novo sentido. Possibilita firmeza espiritual invisível, amparo interior. Torna a mulher mais receptiva as novas idéias criadoras do que o homem.

Para que possamos compreender o que se passa com nossa anima ou animus importa entender as relações não como um fato objetivo, mas como uma imagem subjetiva do meu mundo interior.
O SENTIMENTO INFERIOR
Nas nossas formas de reagir e nas atitudes, podemos reconhecer certos traços repetitivos que expressam fantasias internas e que se aproveitam da realidade para tomarem forma. Por exemplo, posso, sem me dar conta, toda vez que estabelecer algum tipo de relação, seja com amigo, colega ou familiar, ter a tendência de, frequentemente, sentir uma pressão forte ou sutil para pegar o comando da situação e manejar o poder sobre o outro. O poder, neste caso, significa a necessidade ou o desejo de ter o controle, por alguma necessidade não reconhecida estará presente em todos os relacionamentos Humanos. Isso pode vir de várias maneiras: dar ao outro conselho não solicitado sobre como melhorar uma atitude; insistindo numa observância rígida em relação a um comportamento; fazendo interpretações agressivas para estabelecer o predomínio; banalizando os efeitos e sentimentos que outras pessoas geram nele.

Tudo isso pode estar indicando uma resposta a um jeito inferior de se relacionar por necessidade de se sentir valorizado ou importante. Por isso, o processo de relação exige que deixemos de julgar o outro e busquemos olhar para nosso mundo interior, procurando reconhecer em nossas intenções e reações efeitos emocionais de questões mal resolvidas.

Isso indica duas coisas: uma que somos inconscientes de nossos estados internos, manifestando um desencontro com nossos sentimentos; e outra, que, além disso, lidamos com eles de forma inferior.

Para entendermos essas questões é importante sublinhar que ter sentimentos e usar a função sentimento são coisas diferentes. Eu posso ter sentimentos positivos e negativos como conteúdo e saber lidar com eles muito bem ou lidar de uma forma inferior. Assim, podemos ter sentimentos negativos na forma de conteúdos infantis e regressivos, viciosos, destrutivos, etc., e ter a maturidade de não explodir ou deslocar esses sentimentos para os outros. Ou podemos ter um sentimento positivo e não saber comunicar e agir de maneira inadequada apesar do sentimento positivo. Independente dos conteúdos envolvidos, a função sentimento só é inferior quando distorcida, imprópria ou inadequada.

Dessa forma, mais do que reconhecer o que se passa dentro de nós, é importante encontrar recursos para lidar com o que encontramos. Muitas vezes não são os sentimentos que levam a estragar a nossa relação com a vida ou ferir nossos entes queridos, mas sim o nosso jeito inferior de funcionar. E natural, em algum momento, estarmos feridos em nossos sentimentos, com alguma sensação negativa, mas isso não implica se deixar tomar por eles.

Também podemos considerar como exemplo certas atitudes tomadas pela espiritualidade quando desconsidera ou evita certas expressões sentimentais positivas, como júbilo e afeto, em certas práticas mediúnicas ou em momentos espiritualmente impoi lautes, por não favorecerem o objetivo almejado ou estarem sendo iratados de maneira inferior, ou por serem expressos de um jeito inadequado e no momento errado. Mesmo os sentimentos mais valorizados, como o amor altruísta e religioso, podem ser carregados de intensidade ilusória e serem "usados" pela função inferior servindo a outros interesses ou em excesso destrutivo, como é o caso de certas culturas e seitas fundamentalistas que doam a vida e matam cruelmente em nome de Deus. Uma coisa é o sacrifício pessoal em doação amorosa e outra é o barbarismo revestido de um discurso religioso.

Quando somos envolvidos e tomados por sentimentos, os transformamos em cargas afetivas. Essas cargas afetivas tendem a ser reprimidas, agregando distúrbios corporais ou comportamentais, e nos tornamos estranhos, pesarosos, exigentes, entre outras coisas. A carga de energia que gastamos se torna gigantesca. Ficamos "presos" em complexos que geram fantasias perniciosas, por exemplo, a tentativa de ficar antecipando coisas de forma negativa. Ou acabamos deslocando-os e escoando-os para os ambientes seguros a que estamos vinculados, principalmente na família, que termina pagando um preço caro por isso e também pode ficar "envenenada" por eles. O trabalho e o casamento são um prato cheio para isto: as relações são recheadas de projeção e exigências que desgastam o relacionamento em discussões intermináveis e imposições de necessidades.

Outro indício de nosso sentimento inferior é a perda de contato da pessoa com aquilo que sente. Quando a função sentir é, por algum motivo, deixada de lado ou ficou desestimulada, torna-se clandestina, descendo para esferas mais inconscientes.

Com isso, toda a orientação do sentir, do gostar, do querer, dá lugar a uma amargura, uma secura, que se faz sentir de forma deslocada. Perdemos a consciência avaliativa dos sentimentos que serão avaliadas de forma inferior, causando "todo tipo de sentimento deslocado, lágrimas na hora errada, brincadeiras esquisitas, apegos e entusiasmos peculiares, emissão de julgamentos de valor quando estes não são relevantes e oscilações generalizadas de humor que variam da exaltação geral à depressão geral". 15

Quando nos movemos pela incapacidade de avaliar através do Sentimento, acabamos exagerando situações sem muito significado e desvalorizamos assuntos importantes. Isto pode ocorrer aos outros ou a si mesmo, sentir o próprio valor não é tarefa fácil. Conforme Hillman, "perdemos contato com a nossa importância, alternando entre a falta de valor depressiva e as ilusões de grandeza. De um lado, exigimos demais e, de outro, vendemo-nos barato".14

Temos muitas formas de mascarar e fugir do confronto com a nossa condição. Preferimos deixar de lado os desafios dolorosos de nossa vida, perdendo a decência através de artimanhas pueris e primitivas. Até o mundo espiritual não escapa disto. Quantos se declaram espiritualistas, (e até alguns falsos espíritas que não entenderam e corrompem a Doutrina) mas se utilizam de informações, deturpando os conhecimentos espirituais, para justificar certas fraquezas ou para fugir de responsabilidades! Encontramos pessoas que chegam ao cúmulo de justificar suas relações extraconjugais com a absurda noção de que, por terem supostamente encontrado uma grande afeição do passado, uma "alma-gêmea", torna-se impossível evitar a traição. Outra grosseira distorção é quando deixamos de ser amorosos, afirmando que é o carma do outro e que ele tem que sofrer. Ou quando evocamos fortes emoções de caráter místico, e delegamos nossas responsabilidades para os Espíritos, chantageando-os com histórias melodramáticas para que eles sejam escravos dos nossos caprichos, isto quando não fazemos o mesmo, num ainda maior distanciamento da razão, em relação a entidades místicas, como duendes e gnomos. E muitas outras coisas... Temos medo de crescer e queremos ficar dependentes.

Agimos com medo e inferioridade, que fazem com que não consigamos assumir e ter claros os nossos sentimentos. Temos dificuldade de sustentar nossos valores e princípios. Em vez de educar, punimos exageradamente; na dificuldade de despedir um funcionário ineficiente, nos estressamos e acabamos magoando mais ainda; não conseguimos lidar com a agressividade alheia, e nem com a nossa. Falta objetividade e posicionamento no lidar com os sentimentos. Quando estamos sob o efeito de um sentimento inferior, tendemos a exagerar e reagimos no tudo ou nada.
A BASE PARA A EDUCAÇÃO DO SENTIMENTO
Dado que o sentimento tanto se manifesta como conteúdo e como função, podemos falar em educar o sentimento ou desenvolver o sentimento. Educação do sentimento parece ser a expressão mais completa, pois a educação é um processo dinâmico, contínuo de transformação que inclui a integração e o desenvolvimento dos sentimentos.

O sentimento só pode ser educado através do próprio sentimento. É uma educação através da fé, pois necessita que confiemos que funcione e que até possa errar. Os sentimentos negativos exigem coragem, paciência e honestidade para convivermos com eles. Quando começamos a relacioná-los de forma adequada e também nos relacionarmos apropriadamente com eles nas situações apresentadas, iniciamos o processo de elaborar um sentimento superior. O fato de trazermos esses sentimentos para a consciência gera conhecimento e começamos a modificar nossa personalidade, ocorrendo uma integração entre o eu e o sentimento negativo. Isto leva ao desenvolvimento da função sentimento, uma evolução que passa de uma estreita e rígida forma de perceber e reagir para uma adaptação mais livre e adequada.

Reafirmamos, então, que a educação do sentimento exige fé, humildade e coragem. Coragem psicológica, uma coragem da alma para encontrar-se consigo mesma e enfrentar os seus fantasmas e monstros interiores, para aceitar como seu tudo o que aparecer. Humildade para conseguir colocar-se por baixo, ao encontro de nossa inferioridade e impotência.

A partir disso, encontramos nas relações humanas a melhor forma de educar os sentimentos. Assim, os padrões e dinâmicas que envolvem as formas tradicionais de se relacionar são fontes importantes para o exercício do sentimento. São elas: modos e ajustamento, casamento e relações pessoais, estilo e oportunidade, efeitos, paixão e "tato". Esses são variantes que proporcionam dar expressão e desenvolver a função sentimento. Vamos ver um pouco de cada um deles, a partir do trabalho de Hillman.14

Os modos são fruto da codificação de padrões objetivos de relacionamento. Muitos se opõem a eles por acreditarem ser apenas uma apelo hipócrita aos "bons modos", que na verdade afastam os sentimentos. Costumam então "jogar tudo para o alto" e viver o que estão sentindo. Este tipo de afirmação demonstra a não compreensão real do que significa ter modos. Os modos de maneira alguma se opõem aos sentimentos, eles são na verdade formas de expressão levando em conta os sentimentos de todos. Eles se opõem aos afetos irracionais e não aos sentimentos. Os modos são parte dos ajustamentos. Uma atitude de consideração e compromisso com os outros. O ajustamento implica desenvolver valores do sentimento tais como compartilhar, ajudar, engajar, tomar parte e aceitar. Pressupõem deixar de se afastar e fugir do outro, abandonar certas reservas pessoais. Não podemos esquecer que tudo o que fazemos tem uma cota de poder e um efeito sobre o outro e somos responsáveis por isso.

Outra forma objetiva de nos relacionarmos é o estilo. As diversas situações da vida são oportunidades de cada um mostrar o seu estilo de se relacionar. O estilo não é o estilizado, aquela forma extravagante e árida de se expressar. É uma feliz união entre o sentimento pessoal e as necessidades externas. O estilo, então, é o resultado da ética e da estética, que na verdade não deixam de ser na essência a mesma coisa, pois nossas formas de expressão são também um jeito ético de agir. Mas de uma ética em concordância com essa relação entre os dois mundos, de tal maneira que aquilo que mantém o nosso estilo é adequado tanto à verdade interior do sentimento quanto ao mundo exterior. O estilo demonstra como cada um lida com seus sentimentos e vive os seus valores. Ê a busca de nós mesmos, da nossa marca, de um jeito que torna especial a nossa relação com o mundo.

O "tato" representa a sensibilidade de perceber o tempo e a necessidade dos sentimentos em cada coisa e lugar. Tudo tem um tempo adequado e o "tato" é o sentido da oportunidade, de agir de forma apropriada. Além da sensibilidade de usarmos o tempo ou conceber um tempo adequado, temos na noção de tempo o efeito emocional. O tempo passa tão depressa quando gostamos de alguém ou de alguma coisa, um momento especial e rico de alma, e passa lento e enfadonho quando não nos afeta positivamente. O tempo compartilhado com os outros flui naturalmente? O tato é também um feeling que temos em relação como, uma presença que sente e percebe sem precisar perguntar.

As relações são fundamentais para o exercício dos sentimentos .ique o outro funciona como um espelho para nós. Para Joanna de Ângelis,7 o calor humano nas relações constitui fator vital para o crescimento psicológico, favorecendo o desenvolvimento da área afetiva com da gama e profundidade de sentimentos que existem em germe no imo de cada ser. O efeito que causamos nas pessoas e os efeitos que elas os causam são aspectos sobre os quais devemos prestar atenção para tomarmos consciência das nossas dificuldades e características emocionais. Por exemplo, podemos num simples momento de conversação ter um campo rico de elementos para nos avaliarmos: temos a tendência de nos intimidar numa conversa com outro? Somos exagerados e queremos ha mais atenção nas conversas? Falamos demais e não deixamos o outro se expressar? Contamos vantagens e queremos impressionar? Deixamos as pessoas sonolentas e dispersivas com nossas conversas? Os efeitos e maneiras que nos comunicamos estão falando de como lidamos com os sentimentos. Temos um campo vibracional e estamos passando e recebendo energias pelo teor dos afetos. Que tipo de energia passamos para os outros?

Já que esses aspectos levantados ocorrem na sua maioria nas relações, é nas relações que o sentimento ganha forma, e é através das relações que temos a maior oportunidade de educarmos o sentimento. Prestar atenção às relações e dar a elas sua devida importância é um significativo passo nesse processo. O reconhecimento do valor numa situação ou de alguém cria uma atmosfera de importância que gera profundidade, entendimento e uma intensa troca energética, que alimenta a todos. Para isso, não precisamos lançar mão de artifícios como roupas, decoração e jantares suntuosos, basta ouvir com atenção e interesse. Com isso, vamos criando uma espécie de espelhamento para o outro, no qual ele pode se reconhecer através de nós, sentindo-se amado e cheio de vida. Também vamos ajudar para que eles possam extrair e intensificar valores naturalmente, colocando limite ao que for impróprio. Algumas pessoas possuem uma atitude interna tão bem integrada em termos de sentimento que, independente do lugar onde estiverem, criam uma atmosfera que determina o tom moral para o ambiente e os outros se ajustam naturalmente.

Uma das relações mais apropriadas para educar o sentimento é o casamento. Isto porque, pela intimidade e por questões do passado, ele oferece um terreno fértil para todo tipo de sentimentos negativos. Casar implica um exercício diário para elaborar as diferenças entre os cônjuges. Irritação, mau humor, mágoas, manias, exigências, tédio e tantos outros confrontos que são vividos na relação. Parece que o casamento e/ou a família é o laboratório onde se modelam todos os sentimentos humanos. Quando casamos, nossos votos de fidelidade e compromisso não são apenas para o lado que amamos do nosso cônjuge; casamos também com todos os outros lados que conhecíamos ou não, implicando que nosso lado inferior e do outro também sejam levados para a casa. O que é necessário mais uma vez é uma predisposição para crescer e mudar, mesmo que isso leve tempo. E as coisas da alma costumam ser demoradas. Quando há essa disponibilidade para crescer e aprender juntos, esse universo matrimonial se torna uma experiência profunda e transformadora, com muitas conquistas no campo do sentimento. Pena que nem todos estejam dispostos ou preparados para isso, o que também deve ser respeitado.

Percebemos que trabalhar e educar o sentimento exige uma boa dose de paciência e cuidado. Todo cuidado exige que olhemos para as pequenas coisas. Os relacionamentos pessoais requerem sentimentos pessoais. Nas pequenas atitudes e situações encontra-se o segredo da relação. Aprendemos com os sábios que, apesar de chegarem às questões profundas e cósmicas, nos trazem a beleza e o conhecimento pelas pequenas coisas. São os detalhes pequenos que "matam" ou dão "vida" para uma relação. Pequenas mágoas, constrangimentos, descasos aparentemente insignificantes, pequenos erros e atitudes inadequadas, que geram ressentimentos e vão sendo deixados de lado, tornando árida e apática a relação. Assim como certas atenções, reconhecer virtudes, pequenos favores dão substancialidade que vinculam um ao outro. Como nos diz Hillman: "perder o pequeno é desperdiçar a função sentimento".16 No contato com o outro nos confirmamos enquanto gente. Cada crédito confiado a alguém possibilita reafirmar quem somos, confiando e alimentando nossa autoestima. Isso gera um sentimento de redenção, um estado interior que nos acolhe, a nós e aos outros, que os nossos sentimentos e coração são bons e que mesmo as nossas feridas emocionais mais profundas podem ser expostas, experimentadas e curadas. Podemos chamar esse processo de amor. Um estado que nos recupera a força de viver e nos redime frente ao mundo.

Como refere Angelis, o amor é Hálito Divino que equilibra o Universo, essência fundamental para a vida, que vincula todas as formas vivas com Deus.17 E, para a benfeitora, a terapia eficaz para a maioria dos distúrbios comportamentais, favorecendo ao que ama uma existência edificante e felicitadora.7

Na questão dos relacionamentos, a educação dos sentimentos deve considerar também certos padrões objetivos. Existem certas "regras" ou rituais que são universalmente estabelecidos para reger determinados tipos de relação, como entre o mais velho e o mais novo, entre o mestre e o discípulo, entre o visitante e o anfitrião, entre o chefe e o empregado. São padrões arquetípicos que em muitas culturas apresentam uma riqueza de detalhes, que podem ter conotações místicas e simbólicas. Esses padrões orientam e favorecem a educação dos sentimentos, pois é muito difícil se manter numa posição superior sem arrogância ou subserviência, observar a ordem sem cair na castração familiar, pedir sem impor, etc. É o desafio de estabelecer um equilíbrio dinâmico entre o individual e o coletivo.

Gostaríamos também de comentar o poder transformador do sentimento quando ele pode ser expresso. A inibição dessa expressão danifica a função sentimento. Ou, ao contrário, vivemos exteriormente os nossos sentimentos com tanta intensidade que não conseguimos contatar com profundidade o seu sentido maior ou evitamos a solidão e as complicações que existem dentro de nós, fugindo em vez de trabalhá-las. Expressar o sentimento não quer dizer explosão de afeto, pois explodir é muito diferente de expressar.

A expressão requer um compromisso com aquilo que está sendo expresso, já que podemos explodir e esquecer tudo sem responsabilidade. Esse comprometimento, esse envolvimento desenvolve a função sentimento, favorecendo um aprofundamento e uma intimidade que nos capacita a desmistificar certos medos e inferioridades, o que possibilita potencializar o poder do coração. Vemos o quanto estamos distantes de nossos sentimentos, o quanto confundimos descontração com imaturidade e sentimento com superficialidade, como é difícil cantar, fazer um gesto magnânimo ou uma atitude cortês. Precisamos desenferrujar nosso coração e nos comprometer com os sentimentos sem sermos narcisistas.

O trabalho com nossos sentimentos evita a fuga ou que nos tornemos dissociados. Quando deixamos de lado esses exercícios, os sentimentos inferiores descem a níveis mais instintivos e/ou desaparecem nas profundezas do inconsciente. Isso nos torna confusos em relação aos sentimentos. Não sabemos como nos sentimos e trazemos substitutos ou condicionamentos para expressar os sentimentos, de uma forma que nos colocamos fora daquilo que está sendo vivido. Acabamos expressando com distância e num outro tempo os nossos sentimentos: "quando eu era pequeno...", "se eu tivesse tal coisa, seria feliz", "costumava me sentir de tal modo". Caso perguntemos se gostamos disso ou daquilo, respondemos com conceitos ou trazemos qualidades do objeto e não nossos sentimentos. Quando um dos cônjuges pergunta para a esposa ou para o marido se ela(e) gosta dele(a), não é tanto para reafirmar ou dirimir dúvidas, mas uma forma de fazer com que a pessoa contate com o sentimento que está lá dentro, escondido. A resposta força a contatar consigo e estar presente ali naquele momento.

Por último, devemos analisar certas considerações que julgam as pessoas com a função sentimento bem-trabalhada como supostamente frias. São pessoas que parecem não se envolver muito com o outro ou não demonstrar suas emoções. Na realidade, essas pessoas conseguiram estabelecer uma harmonia e um equilíbrio em torno da função sentimento. Assim, essa suposta "frieza" é fruto de uma capacidade de lidar com as tensões emocionais, do domínio dos elementos envolvidos entre a situação exterior e os valores internos, que para a maioria de nós provocaria suores frios a ponto de descompensar. Elas têm uma atitude positiva e objetiva perante a vida, sem serem melodramáticas. Aí está a diferença entre o conteúdo dos sentimentos (que elas possuem de uma forma intensa) e a função sentimento, que é a forma que elas lidam com os mesmos (com equilíbrio, objetividade e harmonia). Lembramos a imagem de Jesus serena e tranquila e que no coração expandia um amor que jamais outro alguém pode nos dar.

Não é fácil concluir diante deste universo complexo do sentimento. Podemos então dizer algo sobre nossa postura em face do sentimento, e, neste sentido, o melhor que temos a fazer é viver. Enfrentar o que sentimos e termos a coragem de suportar esses aspectos de nós mesmos que parecem imutáveis. Ser paciente é uma condição básica para educarmos o sentimento. Por quanto tempo temos que renunciar ou manter certos sentimentos é parte desse processo. E é assim que, pela continuidade do exercício da função sentimento, podemos encontrar uma nova forma de relação, um novo valor que permite perdoar e superar ressentimentos, assim como abrir novas perspectivas de crescimento.

A função sentimento é a razão da energia da vida, e aquela busca ser e deixar que o outro seja. Ela nos ensina que precisamos interagir e interação é o próprio processo de viver o sentimento, pois o sentimento pressupõe conexão. Ele afirma que nada pode ser adquirido em isolamento cultural. Ampliando isso para a dimensão de uma cultura universal, do homem anímico/mediúnico, notamos que os limites da matéria são quebrados num movimento em que o sentimento redefine o nosso ser.

Vivemos numa rede, uma teia cósmica que se forma pelo misterioso fluxo do amor. A capacidade de conexão, nossa conectividade possibilita a chave para entender uma nova realidade. E essa abertura para o sentimento que possibilita uma transformação de consciência - a consciência interativa do homem cósmico e mediúnico.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1 ANGELIS, J. (Espírito); FRANCO, D. P. (Médium). Triunfo Pessoal. Salvador: LEAL, 2002, cap. 2- O Ser Pensante; p. 35.
2 KARDEC, A. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Rio de Janeiro: FEB, 2006, cap. 17, item 7.
" HILLMAN, J. Anima: anatomia de uma noção personificada. Sáo Paulo: Cultrix, 1990.
4ANGELIS, J. (Espírito); FRANCO, D. P. (Médium). Amor, Imbatível Amor. Salva¬dor: LEAL, 2000, cap. 1.
5 KARDEC, A. O Livro dos Espíritos. Rio de Janeiro: FEB, 2003, questão 939. 6JUNG, C. G. Tipos Psicológicos. Petrópolis: Vozes, 1991 (Obras Completas, Vol. 6), cap. 11 - Definições, § 896-901.
7ANGELIS, J. (Espírito); FRANCO, D. P. (Médium). O Despertar do Espírito. Sal¬vador: LEAL, 2000.
8 KARDEC, A. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Rio de Janeiro: FEB, cap. 11 -item 8.
'ANGELIS, J. (Espírito); FRANCO, D. P. (Médium). Amor, Imbatível Amor. Salva¬dor: LEAL, 2000, cap. 1.
10 HILLMAN, J. & FRANZ, M.-L. V. A Tipologia de Jung. Sáo Paulo: Cultrix, 1995.
11 ANGELIS, J. (Espírito); FRANCO, D. P. (Médium). Vida: desafios e soluções. Sal-
vador: LEAL, 1992, cap. 7.
12 JUNG, C. G. apud WHITMONT, E. A Busca do Símbolo. São Paulo: Cultrix,
1990, pp. 151-152.
13 HILLMAN, J. Uma busca interior em psicologia e religião. São Paulo: Paulus,
1984, p. 129.
14Ibidem, p. 105 e 109.
15 HILLMAN, J. & FRANZ, M.-L. V. Op. cit, pp. 154-156.
16 Ibidem, p.203.
17ANGELIS, J. (Espírito); FRANCO, D. P. (Médium). Jesus e o Evangelho à Luz da Psicologia Profunda. Salvador: LEAL, 2000.

JOANNA DE ÂNGELIS

Sucesso Espiritual

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Ansiedade

TERRORISMO



1 – O ato terrorista que pôs abaixo as duas torres do World Trade Center pode ser considerado uma fatalidade, algo programado?
O mal nunca obedece a planejamento divino. É sempre fruto da maldade humana, que faculta ao Homem o exercício do livre-arbítrio, mas lhe impõe as conseqüências de seus atos, para que aprenda o que deve e o que não deve fazer.

2 – Osama Bin Ladem é considerado por seus seguidores como um instrumento divino. Ele próprio afirmou, em recente entrevista, que Deus impôs uma lição ao imperialismo americano…
Ele é, decididamente, um instrumento das trevas, que se aproveitam de sua maluquice. Só uma mente conturbada, sob inspiração de gênios do mal, poderia maquinar tal atrocidade, atribuindo-a a uma orientação divina.

3 – A morte de tanta gente situa-se como um resgate coletivo?
É preciso cuidado com essa definição, porquanto pode nos levar à idéia de que Deus reuniu todas aquelas pessoas para morrerem juntas, o que justificaria a ação criminosa dos terroristas. Seriam instrumentos de Deus, o que é um absurdo.

4 – Como explicar, então, aquelas mortes?
Não há inocentes na Terra. Moramos num planeta de provas e expiações. Todos temos dívidas do pretérito, fruto de passados desatinos, que justificam qualquer tipo de morte que nos transporte para o Além. É uma contingência do mundo em que vivemos.

5 – Há alguma observação de Jesus sobre o assunto?
Há várias, uma bem pertinente, envolvendo, também, a queda de uma Torre, em Jerusalém, conforme relata Lucas, capítulo 13. Chamado a comentar o assunto, diz Jesus: …esses dezoito, sobre os quais caiu a torre de Siloé e os matou, pensais que foram mais culpados que todos os outros habitantes de Jerusalém? Não, eu vos digo; se não vos arrependerdes, perecereis todos do mesmo modo. Ninguém, portanto, está isento de tal experiência. Só nos livraremos quando, reconhecendo nossas próprias fragilidades, buscarmos a reforma íntima, que nos habilite a viver em mundos mais aprazíveis, onde essas tragédias não ocorrem.

6 – Como ficam os Espíritos que tiveram o corpo desintegrado?
Em situações dessa natureza, mobilizam-se os benfeitores espirituais para socorrer as vítimas. São todas amparadas. Consideremos, entretanto, que nossa condição espiritual não depende de como morremos, mas de como estamos vivendo. Quanto mais desprendidos dos interesses materiais e mais vinculados aos valores espirituais e à prática do bem, melhor será a nossa condição espiritual, ainda que venhamos a desencarnar de forma violenta.

7 – Como ficaram as pessoas que pularam das torres, cometendo suicídio?
A temperatura, num incêndio daquelas proporções, pode atingir os três mil graus centígrados. Imaginemos o que seja isso, lembrando que a água ferve a cem graus. É tão elevada, que a pele se desprega do corpo. Em tal situação, saltar a janela é um ato instintivo de defesa. Eu não enquadraria, portanto, aqueles que pularam, como suicidas.

8 – E os terroristas?
Estes são dignos de pena, iludidos pela ideia de que estavam morrendo como mártires, habilitados ao paraíso, onde os esperariam setenta e duas virgens para distraí-los. Se tivessem a mínima idéia dos sofrimentos que os esperavam, em virtude da violência contra si mesmos, agravada pelo crime inominável, jamais cometeriam tal loucura.


por Richard Simonetti

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

POMADA VOVÔ PEDRO - ENTREVISTA COM JUSELMA COELHO

BATACLAN


Os atentados terroristas em Paris são como uma febre no organismo social. Dói, incomoda e leva a procurar um remédio. E a febre é apenas o sintoma de um drama de natureza moral e espiritual que nunca esteve tão elevado em toda a história da humanidade terrena. O terrorismo nada mais é que a velha necessidade do homem de anular a diferença para preponderar. No caso, usando a lamentável atitude de violência. O nome desse sentimento é poder.

Poder é a coroa de ouro das organizações mais sombrias de todos os tempos. É a mais antiga doença do ser espiritual que faz seu aprendizado nessa escola de provas e expiações onde o egoísmo ainda é soberano.

Uma espessa camada miasmática se forma na chamada psicosfera, a parte astral do planeta mais próxima da matéria física. Esse cinturão de sombras é o resultado dos dejetos mentais da mente encarnada e desencarnada. Culpa, medo, ódio e poder se aglutinam junto a outras matérias mentais formando essa nuvem cinzenta e com vida própria.


A Terra não colhe o fruto indigesto proveniente apenas das cabeças terroristas orientadas pela ganância extremista de grupos de poder. Cada vez que alguém tenta anular a diferença, é uma bomba lançada no fortalecimento desse cinturão de trevas em torno do planeta.

Anular a diferença significa todo ato no qual não se consegue respeitar e reconhecer que o que pertence ao outro é de responsabilidade dele. Existe uma compulsiva e desastrosa necessidade no coração humano de convencer, controlar, mudar, transformar e moldar o outro aos seus modelos de viver. Isso é poder. Isso é terrorismo nos relacionamentos por meio de micro violências.

O terrorismo que explode no Bataclan é o efeito dessa onda miasmática milenar que assola nossa casa planetária. Quando você respeita o outro, quando você reconhece o direito do outro de viver a experiência que lhe convém, quando você percebe que só tem poder real é sobre você mesmo, as relações vão mudar, o mundo começará também a mudar.

Tenham esperança. A febre social em Paris leva todos os continentes a procurarem ajuda na erradicação de suas doenças. Em meio às dolorosas convulsões nasce uma nova ordem que não tardará.

Quer colaborar com esse novo tempo? Comece a desarmar-se. Retire esses explosivos de pretensões e endurecimento na conduta. Liberte-se dessa ânsia de preponderar seja onde for. Melhor que dominar é ser feliz.
Contribua com a diminuição do terrorismo no nosso planeta abençoado. Deixe de querer ter razão sempre.

Autor: Maria Modesto Cravo (espirito), amante do Cristo e servidora do bem,
lhes abençoo com paz. 14/11/15.
Psicografia de Wanderley Oliveira.

sábado, 14 de novembro de 2015

A outra face


Considerando-se o estágio moral em que transitam incontáveis criaturas humanas pelos caminhos do planeta terrestre, ainda vivenciando os instintos agressivos, é compreensível que os relacionamentos nem sempre se realizem de maneira pacífica.
Predominando a natureza animal em detrimento da espiritual, o orgulho se arma de mecanismos de defesa, resultantes da prepotência e da argúcia, para reagir ante os acontecimentos ameaçadores ou que sejam interpretados como tais...
A ação decorrente do raciocínio e da lógica cede lugar aos impulsos agressivos, e estabelecem-se os conflitos quando deveriam vicejar entendimentos e compreensão.
Em razão da fase mais primitiva que racional, qualquer ocorrência desagradável assume proporções inadequadas, que não se justificam, porque os recursos morais da bondade sucumbem ante a cólera que se instala e leva à alucinação.
De certa maneira, remanescendo os comportamentos arbitrários de existências pregressas que não foram domados, facilmente a ira rompe o envoltório delicado da gentileza e acontecem os lamentáveis atritos, que devem e podem ser evitados.
A educação equivocada, que estimula o forte à governança, ao destaque, contribui para que a mansidão e a humildade sejam deixados à margem, catalogadas como fraqueza do caráter e debilidade moral.
O território no qual cada indivíduo se movimenta, após apropriar-se, é defendido com violência, como se a posse tivesse duração infinita, o que constitui lamentável equívoco.
Essa debilidade do sentimento se manifesta na conduta convencional do ser humano que opta por ser temido,quando a finalidade da sua existência é tornar-se amado.
Multiplicam-se, indefinidamente, as pugnas, que passam de uma para outra existência até que as Soberanas Leis imponham a submissão e o reequilíbrio através de expiações afligentes.
A lei é de progresso e, por consequência, a todos cabe o esforço de libertação das heranças enfermiças, dos hábitos primitivos, experienciando conquistas íntimas que se irão acumulando na estrutura emocional que se apresentará em forma de paz e de concórdia.
O conhecimento espírita, porque iluminativo, é o mais eficiente para a edificação moral, defluente da conscientização de que o avanço é inevitável e a repetição das atitudes infelizes constitui estagnação e fracasso...
As dificuldades, portanto, as diferenças de opinião, os insultos e agravamentos devem ser considerados como experimentos, como testes ao aprimoramento espiritual, ao aprendizado das novas condutas exaradas no Evangelho de Jesus.
Quando isso não ocorre, fica-se sujeito à influência maléfica dos Espíritos inferiores que se comprazem em gerar situações embaraçosas, responsáveis por essas condutas lamentáveis.
Indispensável vigiar-se as nascentes do coração, a fim de dominar-se a ira, esta fagulha elétrica responsável por incêndios emocionais de resultados danosos.
Considere-se, ademais, a ocorrência de uma parada cardíaca, de um acidente vascular cerebral de consequências irreversíveis, não programados, mas que sucedem somente por falta de controle emocional, provocados pela raiva...
*   *   *
Aprende a dominar os impulsos da ira, porque a existência terrestre não é uma viagem deliciosa ao país róseo da alegria sem fim...
Esforça-te por compreender o outro lado, a forma como os outros encaram as mesmas ocorrências...
Luta por vencer a arrogância, porque todos os Espíritos que anelam pela paz, pela vitória das paixões têm, como primeiro desafio, a superação dos sentimentos inferiores, aqueles que devem ser substituídos pelos de natureza dignificante.
Se alguém te aflige, é porque se encontra necessitado de ajuda e não de combate, é a sua forma de chamar a atenção para a sua solidão e angústia.
Fogo com fogo aumenta o incêndio devorador.
Treina colocar no braseiro a água da paz e se apagarão as labaredas ameaçadoras.
Não foi por outra razão,. que Jesus propôs: Não resistais ao homem mau, mas a qualquer que vos bater na face direita, oferecei-lhe também a outra, conforme anotou Mateus, no capítulo 5, versículo 39 do seu Evangelho.
Esbordoado, no Pretório, Ele exemplificou o ensinamento verbal, não reagindo às agressões, quando os soldados, tecendo uma coroa de espinhos, puseram-na sobre sua cabeça... mantendo-se em silêncio...
Oferecer a outra face é mais do que expor o lado contrário, a fim de sofrer nova investida da perversidade.
Trata-se da face moral, nobre, que se encontra oculta, aquela rica de sentimentos elevados que distingue uma de outra criatura.
Ninguém é o que apresenta exteriormente, tanto existem conteúdos cruéis ocultos pela educação, pela dissimulação e hipocrisia, como sentimentos relevantes e bons.
Ao seres alcançado por qualquer ocorrência desagradável que te golpeie a emoção, ferindo-te a delicadeza das reservas íntimas, ao invés de reagires, desvela a outra face, a do amor, da compaixão, da misericórdia, agindo com serenidade.
A outra face é o anjo adormecido nas paisagens luminescentes do teu mundo interior.
Ali possuis tesouros de amizade e de ternura que desconheces.
Com essa, a brutal, a reagente, a defensiva, já estás identificado, devendo encontrar-te cansado de vivenciá-la.
Imerge, desse modo, no rio de águas silenciosas do teu mundo íntimo e refresca-te com o seu contributo. Logo depois, deixa que os tesouros do amor do Pai que se encontram adormecidos, fluam suavemente e se incorporem aos conteúdos habituais, substituindo-os ao longo do tempo e predominando por fim.
À medida que tal aconteça, renascerás dos escombros como a Fênix da mitologia, que se renovava e renascia das cinzas que a consumiam.
O bem é a meta que todos devemos alcançar.
Não te permitas, portanto, perturbar, pelas emoções doentias e viciosas que te consomem, destruindo as tuas mais caras realizações espirituais,.
És responsável pelos teus atos, qual semeador que avança, seara adentro, atirando os grãos que irão germinar com o tempo,
Certamente muitos se perderão, outros, no entanto, produzirão multiplicadamente, ensejando colheita superior ao volume ensementado.
Necessário cuidar do tipo das sementes que serão distribuídas pelas tuas mãos.
Semeia bondade e colherás alegria de viver, nunca revidando mal por mal.
*   *   *
Uma faísca, um raio que atinja um depósito de combustível e logo se apresentará a destruição.
Controla-os, na corrente das tuas reflexões, gerando a disciplina da contenção da sua carga poderosa de energia, canalizando-a para os labores enobrecidos que te exornam a luta, as conquistas já logradas que te honorificam.
A outra face encontra-se coberta por camadas de experiências desastrosas.
Retira esse lixo mental e permite que se apresente irisada de sol espiritual a outra face, para que o amor real seja a marca do teu comportamento em qualquer circunstância ou ocorrência difícil.

Joanna de Ângelis
Psicografia do  médium Divaldo P. Franco, na reunião mediúnica
do Centro Espírita Caminho da Redenção, na noite de 15
de abril de 2009, em Salvador, Bahia.
Em 17.08.2009.